quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

STJ utilizando a fórmula de Radbruch


“Apelação Civel: AC 38040015059 ES 038040015059
Relator: Des. Samuel Meira Brasil Júnior
DECISAO MONOCRÁTICA
1. RELATÓRIO  [...]
Em sua peça recursal, (fls. 223-234) a Apelante sustenta a relativização da coisa julgada e a inexistência da sentença proferida nos autos do Mandado de Segurança nº 038930000371.
Contra-razões às fls. 237-241 pelo desprovimento do recurso.
É o relato abreviado dos fatos. Decido na forma do art. 557 do Código de Processo Civil.
2. FUNDAMENTAÇAO [...]
A alegada violação ao direito adquirido não convence, pois o enunciado normativo que o protege, assegura, de igual modo, a prevalência da coisa julgada. Não se pode esquecer que este instituto está ligado a um dos valores funcionais do próprio direito, que é a segurança jurídica. Essa característica, a propósito, encontra-se destacada em diversos precedentes do STJ, dentre os quais cito o seguinte:
PROCESSO CIVIL - FGTS - EXPURGOS INFLACIONÁRIOS - AÇAO RESCISÓRIA - INDEFERIMENTO, IN LIMINE, PELA CORTE DE ORIGEM, POR ENTENDER INCIDIR A SÚMULA 343 DO STF - PRETENDIDA INCIDÊNCIA DOS INDEXADORES RECONHECIDOS POSTERIORMENTE PELOS STF E STJ - PRINCÍPIO DA SEGURANÇA DAS RELAÇÕES JURÍDICAS.
1. Após o trânsito em julgado, a lei beneficia a segurança jurídica em lugar da justiça. O fato de a matéria ser controvertida afasta a possibilidade de violação de "literal disposição de lei" (art. 485, inciso V, do Código de Processo Civil), ainda que a jurisprudência tenha-se firmado de acordo com a pretensão da parte. (...)
(REsp 720.170/PB, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 22.08.2006, DJ 01.09.2006 p. 246).
Portanto, se não há inexistência formal (falta de citação) ou substancial (inadmissibilidade jurídica dos resultados), nem mesmo injustiça em grau insuportável (RADBRUCH), os efeitos da coisa julgada devem prevalecer. Assim sendo, a pretensão recursal da recorrente não procede”
Fica claro no fragmento acima apontado que Radbruch é interpretado apenas parcialmente, e de maneira conveniente para o fim buscado na sentença.
Não obstante lembramos que a doutrina brasileira demonstra alguns tímidos avanços frente à interpretação e aplicação dos princípios e mandamentos jurídicos do professor de Heidelberg demonstrando, ainda que embrionariamente, um gradual progresso na filosofia do Direito em nossos tribunais.
Na busca de decisões mais justas e mais coerentes com a finalidade do Direito, o jurista pátrio vem galgando argumentos na teoria filosófica do Direito, indo além da fórmula de Radbruch propriamente dita e se lançando em outras construções do autor alemão. Como vemos a seguir:
“CONSTITUCIONALIDADE. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR. BANCO CENTRAL DO BRASIL. LEI9.650, DE 1998. PRAZO DE DECADÊNCIA. LEI 8.112, DE 1991, ART. 251. CONVERSÃO DE LICENÇA PRÊMIO EM PECÚNIA. DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE. ADIn 449-2/DF. EFEITOS.
1. O prazo decadencial de que trata o § 1º do art. 19 da Lei 9.650, de 1998, não se aplica aos casos em que servidor do Banco Central busca anular ato administrativo.
2. É certo que o entendimento predominante é de que os efeitos da declaração de inconstitucionalidade ditada pelo Supremo Tribunal Federal são ex tunc. Todavia, é de se atentar que, quando antes da declaração de inconstitucionalidade da lei, se estabelecem relações, sem qualquer dúvida da sua legitimidade, manda o bom senso e a prudência que seja obedecida a lei. A doutrina da nulidade ex tunc tem de contemplar temperamentos, sob pena de cometer-se injustiça.
3. "La justicia, para poder derivar de ella las normas jurídicas, tiene que complementar-se con otro factor: finalidad o adecuación a un fin" (Gustav Radbruch).
4. Apelação e remessa providas.”
Claro está que o positivismo ainda segue sem ranhuras em nosso judiciário, mas existem tentativas de se buscar decisões judiciais adequadas a um fim impreterivelmente justo e equitativo. 
Alguns juristas brasileiros, embora superficialmente, começam a decidir sublinhando os auspícios de Gustav Radbruch, no entanto perigosamente sem o conhecimento verdadeiro da teoria do Direito estampado em Radbruch.
“RECURSO ESPECIAL Nº 882.046 - RS (2006/0179224-5)
RELATORA: MINISTRA LAURITA VAZ
RECORRENTE:MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
RECORRIDO: JOSÉ VALDECIR FARIAS (PRESO)
ADVOGADO: ROSÂNGELA DE TOLEDO RODRIGUES - DEFENSORA PÚBLICA
EMENTA
RECURSO ESPECIAL. PENAL. CRIME DE USO DE DOCUMENTO FALSO. REINCIDÊNCIA COMPROVADA. QUANTUM IRRISÓRIO. VIOLAÇAO AO ART. 61, INCISO I, DO CÓDIGO PENAL. OFENSA AOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL NAO COMPROVADA.
1. Restando comprovada a reincidência, a dosimetria da pena deve ocorrer de forma a observar os parâmetros legais de retribuição, prevenção e recuperação do delito, respeitando-se o ordenamento jurídico e a sua finalidade, bem como os princípios da proporcionalidade e razoabilidade, sendo o aumento pela reincidência considerado irrisório ofende-se o disposto no art. 61, inciso I, do Código Penal.
2. A sugerida divergência não foi demonstrada na forma preconizada nos arts. 541, parágrafo único, do Código de Processo Civil e 255, 1.º e 2.º, do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça.
3. Recurso parcialmente conhecido e, nessa parte, provido. [...]
VOTO
A EXMA. SRA. MINISTRA LAURITA VAZ (RELATORA):
De início, verifica-se a tempestividade do especial, o cabimento de sua interposição com amparo no dispositivo constitucional, o interesse recursal, a exposição do dispositivo federal supostamente violado, a legitimidade e o devido prequestionamento, estando presentes os requisitos de admissibilidade. [...]
Com efeito, as circunstâncias agravantes encontram-se na segunda fase da dosimetria e sempre aumentam a pena, quando não constituem ou qualificam o crime. A reincidência é uma circunstância agravante genérica, prevista no art. 61, inciso I, do Código Penal, devendo a pena ser aumentada quando restar comprovado que o agente perpetrou novo crime, depois de transitar em julgado decisão condenatória que, no Brasil ou no estrangeiro, o tenha condenado por delito anterior.
O legislador endereçou um comando, e não uma faculdade, ao aplicador da lei,qual seja: no momento da dosimetria da pena, estando comprovada a reincidência, a sanção carcerária deverá ser sempre agravada. [...]
Realmente o legislador não definiu o aumento pela reincidência, objetivando favorecer o julgador que, diante do caso concreto, poderia analisar a situação e aplicar a pena de forma justa e adequada, atentando-se para as diretrizes legais, como bem explicitou a Exposição de Motivos do Código Penal, in verbis :
"49. Sob a mesma fundamentação doutrinária do Código vigente, o Projeto busca assegurar a individualização da pena sob critérios mais abrangentes e precisos. Transcende-se, assim, o sentido individualizador do Código vigente, restrito à fixação da quantidade da pena, dentro de limites estabelecidos, para oferecer ao arbitrium iudices variada gama de opções, que em determinadas circunstâncias pode envolver o tipo da sanção a ser aplicada. "
Cabe ressaltar que a aplicação da lei penal deve respeitar o ordenamento jurídico e a sua finalidade, bem como os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. Como bem salienta Assis Toledo, "a característica do ordenamento jurídico que primeiro salta aos olhos é a sua finalidade preventiva: antes de punir ou com o punir, quer evitar o crime. Com razão assinala Radbruch: "...importa não esquecer que o direito não pretende somente julgar a conduta humana; pretende também determiná-la em harmonia com seus preceitos e impedir toda a conduta contrária a eles." [...] Prevenção geral e especial são, pois, conceitos que se completam. E, ainda, que isto possa parecer incoerente, não excluem o necessário caráter retributivo da pena criminal no momento de sua aplicação, pois não se pode negar que pena cominada não é igual a pena concretizada, e que esta última é realmente pena da culpabilidade e mais tudo isto: verdadeira expiação, meio de neutralização atividade criminosa potencial ou, ainda, ensejo para recuperação, se possível, do delinqüente, possibilitando o seu retorno à convivência pacífica na comunidade dos homens livres" ( in Princípio Básicos de Direito Penal, 4.ª ed., Saraiva, p. 3).
Como se vê, a reincidência deve ser majorada de forma proporcional e razoável, o que não aconteceu no caso em apreço.
Ante o exposto, CONHEÇO PARCIALMENTE do recurso e DOU-LHE PROVIMENTO para, reformando o acórdão recorrido, restabelecer o aumento de 6 (seis) meses, nos termos do art. 61, inciso I, do Código Penal, fixado na sentença condenatória. Assim, mantida as demais cominações do acórdão recorrido, a pena deve ser fixada em 1 (um) ano e 6 (seis) meses de reclusão.
É o voto.
MINISTRA LAURITA VAZ
Relatora

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