O “carona” no sistema de registro de preços
conforme Decreto nº 7.892/2013
http://jus.com.br/revista/texto/23747
Publicado em 02/2013
A utilização do Sistema de
Registro de Preços importa uma série de vantagens para a Administração Pública
e a possibilidade do “carona” é uma forma inteligente e vantajosa para ser
utilizada pelos entes públicos.
1. Introdução
Para a
realização das suas atividades, a Administração necessita firmar contratos com
terceiros com a finalidade de obter produtos e serviços. Para evitar a escolha
de forma imprópria desses terceiros, a Constituição Federal de 1988 dispõe em
seu art. 37, inciso XXI que “ressalvados os casos especificados na legislação,
as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de
licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes”.
A licitação
é um procedimento anterior ao contrato, onde vários fornecedores oferecem suas
propostas e a Administração escolhe aquela que for mais vantajosa para atingir
o interesse público. Trata-se, portanto, de um procedimento administrativo de
natureza seletiva.
Compete
privativamente à União legislar sobre “normas gerais de licitação e
contratação, em todas as modalidades, para as administrações públicas diretas,
autárquicas e fundacionais da União, Estados, Distrito Federal e Municípios,
obedecido o disposto no art. 37, XXI, e para as empresas públicas e sociedades
de economia mista, nos termos do art. 173, § 1°, III” (art. 22, inciso XXVII da
CF/88).
A Lei que
regula o procedimento das licitações é a 8.666 de 21/06/1993 (Estatuto dos
Contratos e Licitações), norma de caráter geral, editada com base na competência
privativa da União para legislar, nos termos do art. 22, inciso XXVII da
Constituição Federal de 1988.
Inserido
nesse sistema está o procedimento do Sistema de Registro de Preços, forma de
contratação da Administração previsto no art. 15 da Lei 8.666/93. Tal
procedimento foi regulamentado por Decreto, vigorando, atualmente, o Decreto nº
7.892 de 23 de janeiro de 2013 que trata do Sistema de Registro de Preços.
Tema que já
suscitava grandes debates na doutrina dizia respeito à possibilidade de
utilização da ata de registro de preços por outros entes que não haviam
participado do procedimento licitatório da formação daquela ata de registro de
preços, comumente chamado de “carona”. O novo Decreto dedicou um capítulo para
o “carona”, disciplinando o procedimento para a utilização da ata por outros
entes não participantes, objeto de estudo no presente artigo.
2. O Sistema de
Registro de Preços
A Lei
8.666/93 determina em seu art. 15, inciso II que as compras, sempre que
possível, deverão ser processadas através do sistema de registro de preços. No
mesmo artigo, o §3º determina que o sistema será regulamentado por decreto,
levando-se em conta as peculiaridades regionais, atendidas ainda as condições
de seleção feita mediante concorrência, a estipulação prévia do sistema de
controle e atualização dos preços registrados e a validade do registro não
superior a um ano.
As normas
gerais sobre licitações e contratos administrativos, de observância obrigatória
pelos Poderes da União, Estados, do Distrito Federal e dos Municípios são
previstas na lei de Licitações (8.666/93). No entanto, para regulamentar alguns
dispositivos da norma geral, possibilita-se a qualquer dos entes federativos
estabelecerem a própria regulamentação específica, sempre obedecendo aos
preceitos gerais da Lei. 8.666/93.
Para
regulamentar o sistema de registro de preços no âmbito da União, vigorava o
decreto 3.931, de 19/09/2001, alterado pelo decreto 4.342 de 23/08/2002 e
recentemente revogado pelo decreto 7.892 de 23 de janeiro de 2013. Logo em seu
art. 2º, o novo Decreto trata de conceituar alguns institutos, como o sistema
de registro de preços, segundo o qual, é o “conjunto de procedimentos para
registro formal de preços relativos à prestação de serviços e aquisição de
bens, para contratações futuras”.
Jorge
Ulisses Jacoby Fernandes conceitua o Sistema de Registro de Preços como sendo
“um procedimento especial de licitação que se efetiva por meio de uma
concorrência ou pregão sui generis, selecionando a proposta mais vantajosa, com
observância do princípio da isonomia, para eventual e futura contratação pela
Administração” (FERNANDES, 2006, p. 31).
Esse
procedimento especial oferece condições similares às praticadas no setor
privado para compras, não deixando de lado os preceitos aplicáveis à Administração
Pública, notadamente no que toca a realização de licitação.
Quanto à
realização na modalidade de concorrência ou pregão, o art. 7º do decreto
7.892/2013 estabelece a necessidade de tais modalidades, precedidas de ampla
pesquisa de mercado. A peculiaridade do sistema de registro de preços no
tocante à licitação é que, finalizado a concorrência ou o pregão, não há a
obrigação da Administração Pública promover as aquisições, visto que as compras
serão realizadas de acordo com as necessidades do ente público, sendo o
contrato firmado posteriormente, no momento da aquisição.
Vale
destacar que o novo decreto (7.892/2013), em seu art. 3º, utiliza o verbo
“poderá” ao estatuir as hipóteses de utilização do sistema de registro de
preços, conferindo um caráter discricionário na utilização do sistema, ao passo
que o antigo decreto (3.931/2001) utilizava o termo “preferencialmente”. Assim,
o art. 3º estatuí as hipóteses de utilização, senão vejamos:
Art.
3º O Sistema de Registro de Preços poderá ser adotado nas seguintes
hipóteses:
I - quando,
pelas características do bem ou serviço, houver necessidade de contratações
frequentes;
II - quando
for conveniente a aquisição de bens com previsão de entregas parceladas ou
contratação de serviços remunerados por unidade de medida ou em regime de
tarefa;
III - quando
for conveniente a aquisição de bens ou a contratação de serviços para
atendimento a mais de um órgão ou entidade, ou a programas de governo; ou
IV - quando,
pela natureza do objeto, não for possível definir previamente o quantitativo a
ser demandado pela Administração.
Portanto, o
sistema de registro de preços é um procedimento que poderá ser utilizado nas
hipóteses previstas pelo art. 3º do Decreto 7.892/2013, com o objetivo de
selecionar a proposta mais vantajosa para a Administração Pública, formando-se
uma espécie de cadastro para eventual e futura contratação, quando houver a
necessidade de tal contratação pela Administração.
3. Vantagens e
desvantagens do Sistema de Registro de Preços
Inúmeras são
as vantagens para a Administração Pública na utilização do sistema de registro
de preços, como a possibilidade de fracionamento das aquisições, a padronização
dos preços, a redução de volume de estoques a desnecessidade de dotação
orçamentária, a redução dos gastos e simplificação administrativa, a rapidez na
contratação e otimização dos gastos públicos, atualidade dos preços dentre
outras.
José dos
Santos Carvalho Filho em sua obra Manual de Direito Administrativo, diz que o
registro de preços é “necessário para a obtenção de certa uniformidade e
regularidade na aquisição dos bens. Por tal motivo, urge que haja atualização
Periódica no sistema de registro de preços, pela qual se compromete a fornecer,
em determinado prazo, não superior a um ano, o objeto licitado conforme as
necessidades da Administração” (CARVALHO FILHO, 2012, p. 186).
A
desnecessidade de dotação orçamentária se mostra de extrema importância
prática, visto que a Administração, com a adoção do sistema de registro de
preços, pode deixar selecionada a proposta mais vantajosa e ficar no aguardo da
aprovação dos recursos orçamentários. Jorge Ulisses Jacoby Fernandes disserta
acerca de tal vantagem, afirmando que:
Não há
necessidade de que o órgão tenha prévia dotação orçamentária, porque o Sistema
de Registro de Preços, ao contrário da licitação convencional, não obriga a
Administração Pública, em face à expressa disposição legal nesse sentido
(...)”(FERNANDES, 2006, p. 98).
O Sistema de
Registro de Preços é uma importante ferramenta para que se tenha a padronização
de preços dos produtos similares, uma vez que permite a troca de informações
entre os órgãos com o objetivo de evitar distorções entre os valores dos
produtos adquiridos nas mesmas condições. Acerca da padronização dos preços,
Marçal Justen Filho afirma:
Os diversos
órgãos da Administração deverão trocar informações para evitar a prática de
preços conflitantes e variados para produtos similares. Isso permitirá a
detecção de distorções e imporá ao gestor de recursos públicos o dever de recusar
contratação por preços superiores aos adotados em outros órgãos. (JUSTEN FILHO,
2010, p. 190 e 191)
Na medida em
que há uma simplificação do processo com a consequente diminuição do número de
licitações a serem realizados, importa numa grande redução dos custos
administrativos e redução da burocracia que muitas vezes é um entrave para o
desenvolvimento das atividades da Administração, ocasionando um método para
realizar as aquisições de forma rápida e vantajosa.
Entretanto,
alguns autores apontam algumas desvantagens na utilização do Sistema de
Registro de Preços, como a complexidade da concorrência, o parco número de
servidores para serem utilizados no trabalho de atualização de tabelas, a
dificuldade de prever todos os itens da tabela bem como a possibilidade de
formação de cartéis.
Interessantes
as palavras de Jorge Ulisses Jacoby Fernandes quando, dissertando sobre
as desvantagens do Sistema de Registro de Preços, rebate o argumento de
formação de cartéis:
Quanto à
formação de cartel, mostra-se um argumento fantasioso. Primeiro, porque não há
sistema no mundo capaz de evitar sua formação; depois, porque o Sistema de
Registro de Preços é muito mais dinâmico do que uma licitação convencional;
finalmente porque, honestamente, mesmo que se forme cartel, a Administração
Pública tem previamente – na pesquisa de preços promovida – os preços razoáveis
e os licitantes, cartelizados ou não, têm de se manter nos limites desse preço;
não há lesão aos cofres públicos. (FERNANDES, 2006, p. 107)
Marçal
Justen Filho cita ainda como inconvenientes a obsolescência e a incompletude:
A
obsolescência, no caso, caracteriza-se pela defasagem entre os dados do
registro e a realidade do mercado. Podem surgir novos produtos, os preços podem
variar e assim por diante. (...) A incompletude é efeito reflexo da
padronização imposta pelo registro de preços.(...) Muitas vezes, o registro
contempla produtos com especificações ou qualidades genéricas, que não atendem
a necessidades específicas. (JUSTEN FILHO, 2010, p. 194)
Vale dizer
que o Decreto 7.892/2013 previu em seu art. 9º, inciso XI a necessidade de
realização periódica de pesquisa de mercado para comprovação da vantagem,
impedindo a ocorrência da obsolescência citada por Marçal Justen Filho como
inconveniente para o sistema de registro de preços.
Portanto,
temos que as vantagens na utilização do Sistema de Registro de Preços são
várias e devem prevalecer diante das poucas desvantagens citadas, que podem ser
combatidas com a utilização adequada do sistema.
4. A figura do “carona”
ou “órgão não participante”
Como visto,
o Sistema de Registro de Preços permite à Administração contratar serviços e
adquirir bens de forma célere e eficiente, valendo-se de um cadastro de preços
previamente elaborado por meio de licitação, seja na modalidade concorrência ou
pregão.
O decreto
3.931/2001 tratava no seu art. 8º do instituto da adesão à ata de registro de
preços, comumente denominado “carona”, quando permitia que órgãos e entidades
da Administração que não participaram da licitação, após consultar o órgão
gerenciador e o fornecedor registrado, demonstrando a vantagem da adesão,
celebrar contratos valendo-se da ata de registro de preços do outro ente.
Marçal
Justen Filho em sua obra Comentários à Lei de Licitações e Contratos
Administrativos dá a seguinte definição para o “carona”:
Em síntese,
‘carona’ consiste na contratação fundada num sistema de registro de preços em
vigor, mas envolvendo uma entidade estatal dele não participante originalmente,
com a peculiaridade de que os quantitativos contratados não serão computados
para o exaurimento do limite máximo. De acordo com a prática, a única restrição
admitida reside no limite de 100% do quantitativo máximo objeto do registro por
entidade. (JUSTEN FILHO, 2010, p. 207)
Como
inovação, o Decreto 7.892/2013 trouxe em seu art. 2º, inciso V a definição para
órgão não participante (carona), in verbis:
Art.
2º Para os efeitos deste Decreto, são adotadas as seguintes definições:
(...)
V - órgão
não participante - órgão ou entidade da administração pública que, não tendo
participado dos procedimentos iniciais da licitação, atendidos os requisitos
desta norma, faz adesão à ata de registro de preços.
O que se
mostra primordial para ser “carona” em outro processo licitatório é o dever do
órgão interessado em demonstrar a vantagem da adesão sobre o sistema
convencional, ou seja, a utilização do instituto do carona deve importar numa
vantagem superior a um novo processo. Conforme o art. 22 do Decreto 7.892/2013,
além de demonstrar a vantagem, faz-se necessário a anuência do órgão
gerenciador:
Art.
22. Desde que devidamente justificada a vantagem, a ata de
registro de preços, durante sua vigência, poderá ser utilizada por qualquer
órgão ou entidade da administração pública federal que não tenha participado do
certame licitatório, mediante anuência do órgão gerenciador. (grifo
nosso)
Ademais,
“caberá ao fornecedor beneficiário da ata de registro de preços, observadas as
condições nela estabelecidas, optar pela aceitação ou não do fornecimento
decorrente de adesão, desde que não prejudique as obrigações presentes e
futuras decorrentes da ata, assumidas com o órgão gerenciador e órgãos
participantes” (art. 22, §2º).
Ao
contrário do decreto anterior que só tratava do instituto do “carona” num único
artigo (art. 8º) com três parágrafos, o Decreto 7.892/2013 dedicou o capítulo
IX, com um artigo e nove parágrafos, para a “utilização da ata de registro de
preços por órgão ou entidades não participantes”, regulamentando alguns pontos
que geravam discussão por conta da ausência de previsão normativa, como o
quantitativo decorrente das adesões à ata de registro de preços que “não poderá
exceder, na totalidade, ao quíntuplo do quantitativo de cada item registrado na
ata de registro de preços para o órgão gerenciador e órgãos participantes”
(art. 22, §4º do Dec 7.892/2013).
A única
restrição quanto ao carona no decreto revogado (3.931/2001) dizia respeito ao
limite de cem por cento dos quantitativos registrados na Ata de Registro de
Preços para as aquisições ou contratações por órgãos não participantes:
Art. 8º A
Ata de Registro de Preços, durante sua vigência, poderá ser utilizada por
qualquer órgão ou entidade da Administração que não tenha participado do
certame licitatório, mediante prévia consulta ao órgão gerenciador, desde que
devidamente comprovada a vantagem.
(...)
§ 3º As
aquisições ou contratações adicionais a que se refere este artigo não poderão
exceder, por órgão ou entidade, a cem por cento dos quantitativos registrados
na Ata de Registro de Preços.(Incluído pelo Decreto nº 4.342, de 23.8.2002)
Tal
restrição foi mantida pelo §3º do art. 22 do novo Decreto:
Art. 22.
(...)
§ 3º
As aquisições ou contratações adicionais a que se refere este artigo não
poderão exceder, por órgão ou entidade, a cem por cento dos quantitativos dos
itens do instrumento convocatório e registrados na ata de registro de preços
para o órgão gerenciador e órgãos participantes.
O instituto
do “carona” sempre suscitou debates, mormente no âmbito doutrinário, como se
percebe dos comentários de Marçal Justen Filho em sua obra já citada:
O
Regulamento explicitamente admitiu a possibilidade de utilização do registro de
preços por entidades não vinculadas originariamente à sua instituição (art.
8º). Posteriormente, foi introduzido inovação permitindo a superação dos
quantitativos máximos previstos na licitação original, o que não apenas
configura como ofensivo ao princípio da legalidade mas também infringe a
essência da sistemática constitucional e legislativa sobre licitações e
contratações administrativas.
(...)
A solução
desbordou os limites da lei e produziu resultado teratológico, especialmente
porque propicia contratações ilimitadas com base em uma mesma e única
licitação. A figura do ‘carona’ é inquestionavelmente ilegal e eivada de uma série
de vícios. (JUSTEN FILHO, 2010, p. 206 e 207)
Alguns
doutrinadores ainda combatem a solução do carona afirmando haver infração aos
princípios da legalidade, da vinculação ao edital, à disciplina da habilitação,
ao limite legal à ampliação dos quantitativos contratados, ao princípio da
República, à isonomia bem como importa na criação de uma nova hipótese de
dispensa de licitação.
No que pese
os argumentos contrários ao procedimento do “carona”, Jorge Ulisses Jacoby
Fernades em artigo publicado na internet defende a utilização do carona,
mencionando vantagens na sua utilização, senão vejamos:
O carona no
processo de licitação é um órgão que antes de proceder à contratação direta sem
licitação ou a licitação verifica já possuir, em outro órgão público, da mesma
esfera ou de outra, o produto desejado em condições de vantagem de oferta
sobre o mercado já comprovadas. Permite-se ao carona que diante da prévia
licitação do objeto semelhante por outros órgãos, com acatamento das mesmas
regras que aplicaria em seu procedimento, reduzir os custos operacionais de uma
ação seletiva.
É
precisamente nesse ponto que são olvidados pressupostos fundamentais da
licitação enquanto processo: a finalidade não é servir aos licitantes, mas
ao interesse público; a observância da isonomia não é para distribuir demandas
uniformemente entre os fornecedores, mas para ampliar a competição visando a
busca de proposta mais vantajosa. (grifo nosso) (FERNANDES, ON-LINE)
Em meio à
polêmica existente no âmbito doutrinário quanto à utilização do procedimento do
carona, o Tribunal de Contas da União já se manifestou em algumas ocasiões
permitindo o procedimento, recomendando, contudo, a definição de limites para a
adesão de órgãos não participantes, como aconteceu no Acórdão 1487/2007 do TCU.
Entretanto,
como não houve regulamentação desses limites pela Administração Pública, em
2012 o TCU novamente pronunciou-se sobre o procedimento do carona, fixando
limites no Acórdão 1233/2012, como se percebe dos trechos a seguir
colacionados:
29. Mais preocupante,
ainda, é a constatação de que 64% das contratações por SRP foram realizadas por
meio de adesões fundamentadas nos art. 8º do Decreto 3.931/2001, prática de
adesão tardia (por órgão não participante da licitação pelo SRP), mais
conhecida como "carona".
30. O que se
abstrai é que, o que deveria ser exceção virou prática comum. O planejamento
conjunto para a criação de ata não vem se realizando.
31. Como bem
frisou a unidade técnica, a problemática envolvendo a adesão tardia e ilimitada
à atas de registro de preços tem sido preocupação constante desta Corte de
Contas, que já se manifestou contrariamente a sua prática irrestrita por meio
do Acórdão 1.487/2007-TCU-Plenário, ora em fase de recurso.32. É de se
esclarecer que, naquele decisum houve determinação para que fossem reavaliadas
as regras previstas na norma regulamentar, de forma a estabelecer limites para
a adesão à Ata de Registro de Preços por outros órgãos e outras entidades.33.
De qualquer forma, reconheço que o planejamento conjunto para a geração de ata
de registro de preço atende ao espírito da legislação quando realizada seguindo
os procedimentos definidos no Decreto já mencionado, especialmente, no que
tange à necessidade de que haja planejamento. Nesse aspecto, além de dar
cumprimento ao princípio constitucional da eficiência, com certeza atenderá,
também, ao princípio da legalidade, tornando-se prática de grande vantajosidade
para a administração, conforme pode ser constatado no exemplo apresentados no
Relatório de consolidação (item 244).34. Entretanto, é certo que a situação se
torna muito preocupante se forem consideradas as adesões a atas com indícios de
graves irregularidades, como os casos também mencionados no Relatório
precedente (itens 246/ 250).35. A possibilidade de fraude é fator que não pode
ser afastado nas contratações de grande vulto. Não estou defendendo a presunção
de má-fé na conduta do gestor que defende a adesão à ata de registro ou mesmo
da empresa contratada. Entretanto, não é adequado ter por razoáveis atitudes como
as mencionadas no item 248 do Relatório, a exemplo da não declaração da
fundamentação legal que sustenta o motivo da criação da ata; da não realização
do planejamento da contratação, tanto na criação da ata quanto na adesão; da
não fixação dos quantitativos máximos que serão adquiridos por meio de ata; da
não demonstração da vantajosidade em aderir à ata; e da adesão à ata de
registro de preços oriunda de licitação com critérios e condições aplicáveis ao
ente que registrou a ata.36. A adesão tardia (carona), que deveria ser exceção,
tornou-se prática comum.
(...)43.
Como se vê, não há divergência nos entendimentos quanto ao fato de o SRP, se
utilizado de acordo com as normas legais vigentes, apresenta potencial
fantástico de racionalizar as aquisições de bens e serviços pela Administração
Pública, podendo trazer significativa economia aos cofres públicos.44.
Entretanto, conforme defende o Parquet, essas vantagens não podem ser obtidas à
custa do descumprimento da legislação específica de licitações ou dos princípios
constitucionais que regem a matéria. Assim, a adesão ilimitada (ou adesão sem
regras claras) às atas, conforme pode ser visto nos pareceres, textos
doutrinários e exemplos trazidos aos autos, poderia representar clara ofensa ao
disposto no art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal, que exige que compras
e serviços sejam contratados mediante processo de licitação pública que
assegure igualdade de condições a todos os concorrentes.45. Por ser o Tribunal
órgão essencialmente de controle, não pode deixar de avaliar, também, a
possibilidade de que a sistemática de permitir adesões ilimitadas às Atas de
Registro de Preços, por intermédio de caronas, possa constituir-se em incentivo
a práticas reprováveis, como fraude ao procedimento licitatório e prática da
corrupção, principalmente em licitações destinadas ao fornecimento de grande
vulto.46. Confesso que fiquei perplexo com a informação constante no parecer do
MP/TCU, de que até sites foram criados por empresas privadas com objetivo de
oferecer auxílio nas compras via adesão a atas válidas de órgãos federais,
estaduais e municipais, configurando verdadeira exploração comercial das Atas
de Registro de Preços.47. Nota-se, claramente, que a adesão ilimitada à Ata de
Registro de Preços representa um desvirtuamento do SRP, que tem como
pressuposto principal o planejamento das aquisições pela Administração Pública,
na medida em que propicia a contratação de muito mais itens do que a quantidade
efetivamente licitada. Compreendo, também, que é difícil definir um limite
razoável para a adesão. Este, para mim, ainda é um ponto árduo e que merece
alguma reflexão.48. Entretanto, as distorções experimentadas, na prática, em
relação ao limite máximo de quantitativo passível de contratação com base no
registro de preço, é que me levam a concordar com o entendimento da Sefti e do
Parquet de que é aspecto de fundamental importância para o regular
funcionamento do SRP o devido planejamento que deve ser realizado pelo órgão
gerenciador e pelos órgãos participantes. Os elementos colhidos na presente
auditoria comprovam os problemas que decorrem da adesão ilimitada à Ata de
Registro de Preços, causados, basicamente, pela marcante ausência do indigitado
planejamento dos órgãos e das entidades da Administração Pública.49. Devo observar
que interpretação proposta pela unidade técnica comporta todos os dispositivos
legais e regulamentares, inclusive a adesão tardia (carona) prevista no Decreto
3.931/2001, art. 8º Além do que nessa interpretação, o participante passa a ser
a regra e o "carona", a exceção, como deve ser em organizações que
atentam ao princípio do planejamento.
(...)
9.3.2.1.5.
em atenção ao princípio da vinculação ao instrumento convocatório (Lei
8.666/1993, art. 3º, caput), devem gerenciar a ata de forma que a soma dos
quantitativos contratados em todos os contratos derivados da ata não supere o
quantitativo máximo previsto no edital; (grifo nosso)
Portanto,
ainda em 2012, durante a vigência do Decreto 3.931/2001, o Tribunal de Contas
da União manifestou o entendimento sobre o “carona” no que toca a conduta dos
órgãos gerenciadores, de que a soma dos quantitativos contratados em todos os
contratos derivados da ata observe como limite o quantitativo máximo previsto
no edital. Tal posicionamento da Corte de Contas gerou críticas, em vista da
possível inutilidade conferida ao instituto do “carona”.
Contudo o
Decreto 7.892/2013 tratou de regulamentar o limite para adesão à ata por órgãos
ou entidades não participantes (carona), fixando no seu art. 22, § 4º como
limite o quíntuplo do quantitativo de cada item registrado na ata de registro
de preços, senão vejamos:
Art.
22. Desde que devidamente justificada a vantagem, a ata de registro de
preços, durante sua vigência, poderá ser utilizada por qualquer órgão ou
entidade da administração pública federal que não tenha participado do certame
licitatório, mediante anuência do órgão gerenciador.
§
4º O instrumento convocatório deverá prever que o quantitativo decorrente
das adesões à ata de registro de preços não poderá exceder, na totalidade, ao
quíntuplo do quantitativo de cada item registrado na ata de registro de preços
para o órgão gerenciador e órgãos participantes, independente do número de
órgãos não participantes que aderirem. (grifo nosso)
O
dispositivo transcrito consagrou o limite que já existia no art. 102, §3º do
decreto 7.581/2011 que regulamenta o Regime Diferenciado de Contratações
Públicas - RDC, de que trata a Lei nº 12.462, de 5 de agosto de 2011,
in verbis:
Art. 102. O
órgão ou entidade pública responsável pela execução das obras ou serviços
contemplados no art. 2º que não tenha participado do certame licitatório,
poderá aderir à ata de registro de preços, respeitado o seu prazo de
vigência.
(...)
§ 3º A
quantidade global de bens ou serviços que poderão ser contratados pelos órgãos
aderentes não poderá ser superior a cinco vezes a quantidade prevista para cada
item.
Outra
inovação do decreto 7.892/2013 diz respeito a vedação aos órgãos e entidades da
administração pública federal aderirem a ata de registro de preços gerenciada
por órgão ou entidade municipal, distrital ou estadual (art. 22, §8º) e a
faculdade conferida aos órgãos ou entidades municipais, distritais ou estaduais
de aderirem a ata de registro de preços da Administração Pública Federal (art.
22,§9º).
A vedação
contida no art. 22, §8º do decreto 7.892/2013 já era prevista na Orientação
Normativa nº 21/2009 da Advocacia Geral da União, que não permitia que a
administração federal aderisse à ata de registro de preços de entidade
estadual, distrital ou municipal.
5. Conclusão
O Sistema de
Registro de Preços é um procedimento especial de licitação em que se realiza a
seleção da proposta mais vantajosa para a Administração na aquisição de bens e
serviços, formando-se um cadastro para eventual e futura contratação pela
Administração. Trata-se de um procedimento que oferece condições similares às
praticadas no setor privado para compras, não deixando de lado os preceitos
aplicáveis à Administração Pública, notadamente no que toca a realização de
licitação, visto que se exige a realização de licitação na modalidade
concorrência ou pregão.
O instituto
foi previsto no art. 15, inciso II da Lei 8.666/93, havendo inúmeras vantagens
na sua utilização, como a possibilidade de fracionamento das aquisições, a
padronização dos preços, a redução de volume de estoques a desnecessidade de
dotação orçamentária, a redução dos gastos e simplificação administrativa, a
rapidez na contratação e otimização dos gastos públicos, atualidade dos preços
dentre outras.
Foi previsto
nos decretos que regulamentam o Sistema de Registro de Preços a possibilidade
de a proposta mais vantajosa numa licitação ser aproveitada por outros órgãos e
entidades não participantes. Esse procedimento de adesão ficou conhecido como
“carona”.
Muitas
críticas existem quanto ao procedimento do carona, no entanto, se deve levar em
conta que o procedimento do “carona” sendo utilizado de forma correta pode
trazer inúmeros benefícios para a Administração Pública, não havendo ofensa aos
princípios elencados por aqueles que combatem tal forma de contratação.
A adoção do
procedimento do “carona” nos limites impostos pelo Decreto 7.892/2013 não
configura nova hipótese de dispensa de licitação, na medida em que foi realizado
procedimento licitatório anteriormente pelo órgão gerenciador, ficando apenas a
contratação para ser realizada em momento posterior, quando houvesse
necessidade da aquisição dos produtos ou serviços pela administração.
O principal
problema prático quanto ao carona estava na sua utilização de forma
indiscriminada, ocorrendo algumas vezes abusos, visto que não existia a
previsão de limites para adesão a ata, uma vez que o único limite dizia
respeito a cada órgão ou entidade que quisesse aderir ficava limitada a cem por
cento dos quantitativos dos itens do instrumento convocatório. O Tribunal de
Contas da União, embora permitindo a situação do carona, chegou a impor
limites, como na decisão proferida no Acórdão 1233/2012.
Com a edição
do novo decreto regulamentador do Sistema de Registro de Preços (Dec
7.892/2013), o problema dos limites combatido pelo Tribunal de Contas da União
parece ter sido solucionado, com a imposição do limite do quíntuplo do
quantitativo de cada item registrado na ata de registro de preços (art. 22,
§4º).
Portanto, a
utilização do Sistema de Registro de Preços importa uma série de vantagens para
a Administração Pública e a possibilidade do “carona” é uma forma inteligente e
vantajosa para ser utilizada pelos entes públicos, desde que o façam nos
limites previstos pelo Decreto 7.892/2013, que se mostram compatíveis e
razoáveis.
6. Referências
BRASIL.
Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil.
Brasília, DF, Senado, 1988.
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Preços previsto no art. 15 da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, e dá outras
providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 26 ago 2002.
Disponível em <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 14 de fevereiro de
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<http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 14 de fevereiro de 2013.
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nº 8.666, de 21 de junho de 1993. Regulamenta o art. 37, inciso XXI, da
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Brasília, DF, 22 jun 1993. Disponível em <http://www.planalto.gov.br>.
Acesso em: 14 de fevereiro de 2013.
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CARVALHO
FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo / José dos Santos
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FERNANDES,
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JUSTEN
FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos /
Marçal Justen Filho. – 14 ed. São Paulo: Dialética, 2010.
Autor
Rodrigo Allan
Coutinho GonçalvesProcurador
Federal.
Informações sobre o texto
Como citar este texto (NBR 6023:2002 ABNT):
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