segunda-feira, 18 de abril de 2011

Importante decisão sobre direito do consumidor

Movimentação Processual - 1º Grau 

Nº do Processo0000745-30.2006.8.17.1130 (23320060.0074.5000)
ClasseProcedimento ordinário
Assunto(s)
ComarcaPetrolina
VaraSegunda Vara Cível Comarca de Petrolina
RelatorFrancisco Josafá Moreira
Partes
AdvogadoLUIZ ANTONIO COSTA DE SANTANA.
AdvogadoMARCOS ANTôNIO DE BARROS JúNIOR.
RequerenteANDERSON YUKIHIRO HIRATA.
RequerenteKANICHI HIRATA.
RequerenteKIYO HIRATA.
RequeridoSUL AMERICA SEGUROS SAUDE S/A.
Movimentação
Data18/04/2011 14:49:00
FaseSentença
TextoI) RELATÓRIO (ART. 458, I, CPC) Processo nº 745-30.2006.8.17.1130 Ação ORDINÁRIA Autores: KANICHI HIRATA, KIYO HIRATA, ANDERSON YUKIHIRO HIRATA Requerida: SULAMERICA SEGURO SAÚDE S/A SENTENÇA Vistos, etc... KANICHI HIRATA, KIYO HIRATA, ANDERSON YUKIHIRO HIRATA, devidamente qualificados e habilitados nos autos, ajuizaram a presente Ação Ordinária, em face de SULAMERICA SEGURO SAÚDE S/A, também qualificada e habilitada, aduziram em síntese que aderiram ao plano de saúde mantido pela requerida no ano de 2000, entretanto a demandada não enviou os boletos bancários do ano de 2006 e em contato com esta foram informados que estavam inadimplentes no que concerne ao pagamento do mês de março de 2005. Ocorre que os pagamentos são efetuados via agendamento eletrônico pela internet, através do Banco do Brasil de modo que os autores não deram conta da inadimplência do mês de março, mas para evitar cancelamento do contrato solicitaram a expedição da 2ª via do boleto bancário de março de 2005, bem como do mês de janeiro de 2006, entretanto não obtiveram resposta da requerida. Em novo contato com os prepostos da ré os autores foram informados que o contrato foi cancelado, sem qualquer comunicação prévia. Desta forma, requereram concessão de tutela liminar para que a ré continuasse prestando os serviços e que ao final fosse julgada procedente a presente ação obrigando-se à requerida a manutenção do contrato de Assistência Médica e/ou Hospitalar, declarando nulas as cláusulas contratuais tidas como abusivas, especialmente a que prevê hipótese de rescisão unilateral. Juntou documentos de fls. 16/32. Tutela liminar concedida às fls. 35 obrigando a Sulamerica Seguro de Saúde S/A, a manter o contrato empresarial de assistência médica, nos exatos termos em que foi firmado. Citada e intimada à parte ré (fls. 41/42), interpôs Agravo de Instrumento fls. 46/79. Contestação aduzindo em síntese que os segurados adquiriram individualmente três contratos de seguro saúde e que os autores KIYO HIRATA, KANICHI HIRATA E ANDERSON HIRATA deixaram de pagar, respectivamente, as parcelas 34, 35, e 35, referente aos meses de fevereiro de 2004 e as duas últimas, de março 2004, violando expressamente as cláusulas do contrato que permite o cancelamento do seguro, independentemente de notificação e/ou interpelação judicial e sem direito à indenização. Ademais, alega ter efetuado procedimento de cobrança e que os segurados tiveram plena ciência do Procedimento de regularização contratual, uma vez que os Avisos de Recebimento foram efetivamente cumpridos, requerendo, assim, seja julgada improcedente a presente ação. Juntou documentos de fls. 96/228. Os autores apresentaram Réplica à Contestação fls. 236/239. Audiência de Tentativa de Conciliação realizada, termo às fls. 244, não houve acordo entre as parte litigantes. Em decisão, fls. 297/298, a 4ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco determinou a conversão do agravo de instrumento em retido. Breve o relatório1 dos principais fatos ocorridos no processo. Sem nada mais a relatar, passo a proferir o seguinte decisum2. II) FUNDAMENTAÇÃO (art. 458, II, CPC): Trata-se a presente lide, de ação ordinária em face do SULAMÉRICA SEGURO SAÚDE S/A; alegando os autores que a requerida rescindiu indevidamente o contrato de assistência médica firmado entre as partes, pois, apesar de encontrarem-se inadimplentes não tinham conhecimento de tal situação, já que o pagamento é realizado através de agendamento eletrônico pela internet junto ao Banco do Brasil. Além do mais, a requerida não notificou os autores do cancelamento do contrato O ponto fulcral da lide gira em torno de se comprovar a legalidade da rescisão do contrato por parte da requerida. A suplicada nega a ilegalidade da rescisão unilateral do contrato, alegando previsão no contrato firmado entre as partes de cancelamento deste, independente de notificação em caso de inadimplência. A Constituição Federal em seu artigo 196 determina que a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação. Analisando tal dispositivo percebe-se que os planos de saúde, por prestarem assistência médica estão obrigados a obedecerem ao dispositivo constitucional, oferecendo assistência médica digna a seus segurados. Desta forma, é cristalino que quaisquer cláusulas limitativas dos direitos do segurados, que destoem frontalmente referido dispositivo constitucional deve ser considerada ilegítima. Não se pode olvidar que o contrato firmado pelas partes não obedece à lei que rege os planos e seguros privados de assistência à saúde, que, em seu artigo 13, parágrafo único, inciso II, determina ser vedada suspensão ou a rescisão unilateral do contrato, salvo por fraude ou não-pagamento da mensalidade por período superior a sessenta dias, consecutivos ou não, nos últimos doze meses de vigência do contrato, desde que o consumidor seja comprovadamente notificado até o qüinquagésimo dia de inadimplência. No caso em tela, a empresa requerida reconhece que não notificou antecipadamente os requerentes da rescisão do contrato, alegando, apenas ser legítimo seu ato por previsão contratual. Ocorre que o comportamento da requerida é abusivo conforme preleciona a legislação pátria citada alhures. Destaca-se que o Código de Defesa do Consumidor prescreve que é direito do consumidor ter acesso a produtos e serviços eficientes e seguros, devendo ser informado adequadamente acerca do conteúdo dos contratos por ele firmado para aquisição de produtos e serviços, principalmente, no que se referem aquelas cláusulas que limitem os direitos do consumidor, como as que regulem a rescisão do contrato. Mesmo porque, os contratos de seguro saúde, caracterizados por sua longa duração, tem a continuidade como princípio fundamental de sua existência e, portanto, baseado na confiança que deposita no fornecedor e cria no consumidor a justa expectativa de renovação automática da avença, enquanto o beneficiário cumpra as cláusulas e condições pactuadas, devendo assegurar o tratamento de qualquer doença acometida pelo usuário dentre aqueles relacionadas nos órgãos nacionais e internacionais - Rol de Procedimentos Médicos elaborado com base no CID-10 (Classificação Internacional de Doenças da Organização Mundial da Saúde). No caso em lume os autores sequer receberam uma via do contrato firmado com a requerida, sendo cristalina a conduta indevida por parte da seguradora. Deve-se ainda, levar em consideração o princípio da boa-fé objetiva que limita os contratos particulares e deve respaldar as relações de consumo. Manda o Código de Defesa do Consumidor interpretar às cláusulas limitadores de forma mais favorável ao aderente (art. 47 do CDC), permitindo, como direito básico do consumidor (art. 6º, V, do CDC), a modificação das cláusulas contratuais que estabelecem prestações desproporcionais ou a sua revisão em razão de fatos supervenientes, principalmente quando se trata de contratos de adesão, onde se impõe ao aderente as cláusulas restritivas e limitadoras de seus direitos, muitas vezes de forma abusiva. Neste sentido é o posicionamento da jurisprudência pátria conforme entendimento do Desembargador do Rio de Janeiro, Sérgio Cavalieri Filho que transcrevo abaixo: "Rompendo com a clássica noção de contrato, o Código do Consumidor consagrou a concepção social do contrato, no qual o elemento nuclear não é a mais a autonomia da vontade, mas sim o interesse social. A eficácia jurídica do contrato não depende apenas da manifestação de vontade, mas também, e principalmente, dos seus efeitos sociais e das condições econômicas e sociais das partes que dele participam." (TJRJ, AC n. 515/98, publicado na Revista de Direito n. 38, págs. 299/301) Estabelece, ainda o Código de Defesa do Consumidor, em seu artigo 51, que são nulas de pleno direito as cláusulas contratuais que estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a eqüidade. Percebe-se, que o contrato em discussão foi cancelado de forma automática, sem que fosse oportunizada aos autores a regularização do pagamento do mês que ficou sem a devida quitação, mesmo após a tentativa destes em regularizá-la. Note-se que o animus dos autores era de continuar a relação contratual, tanto que as prestações subseqüentes foram pagas, desta forma, ao não notificar a parte autora antes de cancelar o contrato para oportunizar a regularização da prestação em atraso, desrespeita preceito legal, devendo ser caracterizada como abusiva, não respeitando os princípios elementares que devem nortear os contratos como o da boa-fé e função social. III) DISPOSITIVO (ART. 458, III, CPC): "Ex positis", julgo procedente a ação para reconhecer como abusiva a prática comercial que obstou os autores de pagarem às mensalidades do plano de saúde em atraso e confirmar a tutela antecipada para determinar o pleno restabelecimento do contrato nos moldes contratado mediante o pagamento mensal do prêmio. Em razão da sucumbência condeno a requerida a pagar honorários advocatícios, que arbitro em R$ 2.000,00 (dois mil reais), nos termos do artigo 20, § 4º do CPC e custas processuais. PRIC. Petrolina, 18 de abril de 2011. BEL. FRANCISCO JOSAFÁ MOREIRA JUIZ DE DIREITO 1 Código de Processo Civil - Art. 458. São requisitos essenciais da sentença: inciso I - o relatório, que conterá os nomes das partes, a suma do pedido e da resposta do réu, bem como o registro das principais ocorrências havidas no andamento do processo. 2 Art. 458. Inciso II - os fundamentos em que o juiz analisará as questões de fato e de direito.

Um comentário:

  1. Professor Luiz Antonio,

    Parabéns pela ótima defesa, é mais uma jurisprudência que servirá a todos os casos semelhantes, com abuso pela empresa seguradora. Em que pese, s.m.j, a Constituição Federal é uma conquista da democracia e importantíssima para o estabelecimento de um estado de Bem-estar-social, que tem como parâmetros, entre outros, a justiça e a saúde.
    O sr. defendeu bem ambas as vertentes.

    Pablo Ricardo
    7º periodo - Direito - Uneb

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