As diferenças entre os princípios da razoabilidade e da
proporcionalidade e sua correta aplicação em nosso ordenamento jurídico
http://jus.com.br/revista/texto/22438
Publicado em 08/2012
Os subprincípios da
razoabilidade (equidade, congruência e equivalência) e da proporcionalidade
(adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito) servem de
critério de diferenciação entre eles, além de estabelecer um modo mais preciso
de aplicação destas duas normas jurídicas.
A aplicação imotivada
e sem qualquer critério dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade
tem preocupado muito alguns estudiosos do direito. Portanto, buscar-se-á no
desenvolvimento do presente a elucidação do conteúdo jurídico dos princípios
acima mencionados, aprofundando-se na compreensão de sua correta utilização no
ordenamento jurídico pátrio.
Num primeiro momento,
será feita uma análise dos princípios do direito, devido à incontestável
importância que estes possuem na ordem jurídica brasileira, para posteriormente
analisar seu caráter normativo e as peculiaridades que os diferenciam das
regras do direito.
Após, partir-se-á
para a diferenciação dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade,
realizando o estudo de seus respectivos surgimentos históricos e de seus
subprincípios, demonstrando que estes são critérios relevantes de dissociação
entre estas duas normas jurídicas, para que, por fim, possa-se com mais
propriedade analisar alguns julgados do Supremo Tribunal Federal, o qual muita
das vezes realiza o manuseio da razoabilidade e da proporcionalidade de maneira
incoerente.
I. PRINCÍPIO, SUA
DEFINIÇÃO E IMPORTÂNCIA NO ORDENAMENTO JURÍDICO
É notório o fato de
que a Constituição Federal brasileira de 1988 é em sua grande parte
principiológica, conforme bem analisado por José Afonso da Silva, Paulo
Bonavides e Eros Roberto Grau, possuindo princípios explícitos e implícitos em
seus dispositivos.
Diante disso, é
evidente que nos dias atuais não há como se falar em direito sem falar nos
princípios do direito, motivo pelo qual é necessário defini-los precisamente
não apenas para fins didáticos, mas também para que o seu manuseio possa ser
realizado controladamente pelos tribunais ao proferir suas decisões em um
determinado caso em concreto, evitando-se, assim, confusões com outros
institutos jurídicos.
Com efeito, a
definição popular da palavra princípio se desenvolve como base no preceito de
verdades primeiras, ou seja, onde tudo se inicia.
Juridicamente
falando, a clássica definição de princípio é anglo-saxônica e vem do grande
jurista de Harvard, Ronald Dworkin, o qual diz se tratarem de “mandamentos
baseados em critérios de peso, valor ou importância, pois quando houver vários
princípios a serem utilizados em uma determinada situação, ou até mesmo
princípios que se contradizem, terá validade aquele que possuir maior peso ou
importância, sem, contudo, ocorrer a revogação de sua validade.”[1]
Robert Alexy, baseado
na jurisprudência do Tribunal Constitucional Alemão, ponderou que os princípios
“são mandamentos de otimização, caracterizados pelo fato de poderem ser
cumpridos em diferentes graus, e a medida de seu cumprimento não depende apenas
das possibilidades reais, mas também das possibilidades jurídicas.” [2]
Continua, dizendo que
“no caso de colisão entre os princípios a solução não se resolve com a
determinação imediata de prevalência de um princípio sobre outro, mas é
estabelecida em função da ponderação entre os princípios colidentes, em função
da qual um deles, em determinadas circunstância concretas, recebe a
prevalência.[3]
Interpretando a
definição de Alexy, afirma-se que os princípios são normas que ao se chocarem,
influenciam o intérprete a escolher o melhor a ser aplicado a determinada
situação apenas mediante o critério de ponderação entre os princípios
colidentes, isto é, um princípio não é descartado em um determinado caso para a
utilização de outro mais importante, mas sim, os princípios se completam, sendo
dada maior relevância para aquele detentor de maior peso.
Outras definições não
menos importantes também foram lançadas em nosso ordenamento jurídico, como é o
caso de Luís Diez-Picazo citado por Paulo Bonavides, o qual traz a ideia de que
princípio é “onde se designa as verdades primeiras”, ou seja, “as premissas de
todo um sistema que se desenvolve more geometrico”. [4]
Para Josef Esser,
princípios são aquelas normas que estabelecem fundamentos para que determinado
mandamento seja encontrado.[5] Aprofundando-se mais um pouco nesta
definição, Karl Larenz define os princípios como “normas de grande relevância
para o ordenamento jurídico, na medida em que estabelecem fundamentos normativos
para a interpretação e aplicação do Direito, deles decorrendo, direta ou
indiretamente, normas de comportamento”.[6]
Merecem destaques
ainda as concepções brasileiras sobre o tema, como é o caso do doutrinador
Humberto Bergmann Ávila, o qual, após analisar criteriosamente as mais
profundas características que envolvem os princípios jurídicos, lançou a
seguinte definição:
“Os princípios são
normas imediatamente finalísticas, primariamente prospectivas e com pretensão
de complementaridade e de parcialidade, para cuja aplicação se demanda uma
avaliação da correlação entre olaço se demanda uma avaliaçe de parialidade,
para cuja aplicaç estado de coisas a ser promovido e os efeitos decorrentes da
conduta havida como necessária à sua promoção.” [7]
Interpretando a
definição acima, tem-se que os princípios são normas que visam atingir um fim
determinado, se relacionado um estado de coisas a ser promovido com os efeitos
das condutas necessárias a aplicação de determinado fim.
Ilustrando tal
afirmativa, utilizemo-nos do exemplo dado por Humberto Ávila, citando o
princípio da moralidade. Ora, este exige que uma série de condutas sejam
adotadas para que seu fim possa ser atingido, como a fidelidade, confiança,
honestidade, transparência, sinceridade, boa índole etc. Portanto, estas
qualidades são alguns dos requisitos essenciais para que a moralidade seja
atingida.
Desta forma, pode-se
depreender de todos os entendimentos supracitados, que cada autor tem uma
maneira subjetiva de caracterizar os princípios jurídicos, utilizando-se de
seus próprios vocabulários e entendimentos até então alcançados. Entretanto, em
todas as definições existem traços comuns que nos levam a identificar
rapidamente um princípio, quais sejam, i) seu caráter normativo e finalístico e
ii) sua função de auxiliar na interpretação/aplicação do direito.
É a partir daí que
aflora a importância dos princípios.
Tomando-os como base,
os juristas podem com maior clareza raciocinar diante de um determinado caso e
aplicar o direito em sua melhor forma, sob pena de se assim não o fizerem,
ferir toda a diretriz de hermenêutica jurídica constitucional.
Podemos utilizar como
bons exemplos de que os princípios jurídicos são modeladores de conduta, os
princípios que regem a Administração Pública, tanto os que se encontram
explícitos quanto os que se encontram implícitos no ordenamento jurídico, como
é o caso dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.
Sem qualquer juízo de
valor acerca de suas diferenças, nos dizeres de José Roberto Pimenta Oliveira,
a “razoabilidade e a proporcionalidade são princípios estruturadores de um
ordenamento jurídico-administrativo democrático.” Continua, dizendo que estes
“inibem ou limitam qualquer atuação administrativa desprovida do respeito que a
Constituição estabelece aos órgãos e entidades que devem diuturnamente
responder pela ótima efetivação dos interesses coletivos prestigiados pelo
sistema normativo, posto à cura administrativa.” [8]
Sendo assim, jamais
pode a Administração Pública atuar na inobservância destes tão relevantes
princípios. Estes, por si só demonstram a importância da classe na qual
pertencem, indicando o seu caráter normativo e finalístico, que no exemplo em
questão é a efetivação do interesse público coletivo, representando ainda, que
a aplicação das regras jurídicas deve ser feita de forma controlada, na medida
absolutamente necessária para conseguir atingir o fim almejado, o que prova que
os princípios servem de base para a interpretação e aplicação do direito.
I.I. O Princípio como
norma jurídica
Antes de se adentrar
ao mérito do presente tópico, urge mencionar a definição básica de norma
jurídica, qual seja, um comando imperativo de conduta humana, uma ordem
jurídica, que determina que seus destinatários ajam da maneira por ela
esperada. Um ordenamento jurídico é formado acima de tudo por normas jurídicas.
Ao se analisar a
definição de norma jurídica, automaticamente nos remetemos à idéia de regra,
por se tratarem de imperativos que regulam a vida do homem em sociedade.
Entretanto, não se pode esquecer que recentemente a doutrina tem entendido que
os princípios do direito também integram o mundo das normas jurídicas, dado à
sua grande relevância na seara do direito.
Há muitos anos atrás,
trabalhava-se com a idéia de que os princípios eram meros auxiliares para a
aplicação e interpretação do direito. Atualmente, porém, na era do
pós-positivismo, onde restou superada a fase pela qual as regras eram o
mandamento máximo independentemente de seu conteúdo (positivismo), vários são
os doutrinadores que defendem a normatividade e a positivação dos princípios.
Neste mister, o
brilhante Professor Paulo Bonavides vaticina, in verbis:
A terceira
fase, enfim, é a do pós-positivismo que corresponde aos grandes momentos
constituintes das últimas décadas do século XX. As novas Constituições
promulgadas acentuam a hegemonia axiológica dos princípios, convertidos em pedestal
normativo sobre o qual assenta todo o edifício jurídico dos novos sistemas
constitucionais.[9] (grifamos)
Tal fato se comprova
também, a partir de uma breve leitura do texto Constitucional, tendo em vista
que de muitos de seus artigos emanam explicitamente mandamentos a serem
cumpridos em forma de princípios, como é o caso, por exemplo, do artigo 37 da
lex legum, que determina que a Administração Pública direta e indireta de
qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos
Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade,
publicidade e eficiência.
Ora, a expressão
"obedecerá" nada mais é do que um mandamento que vincula os atos da
Administração Pública aos princípios supra mencionados, podendo, em caso de
descumprimento, ser exigido o seu efetivo cumprimento, cogitando-se até mesmo
em requerer a intervenção do Poder Judiciário para que seja sanada a
irregularidade de sua não observação.
Da mesma maneira,
encontra-se o caráter normativo dos princípios em nosso artigo 4º da Lei Maior,
o qual determina que a República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações
internacionais pelos princípios da independência nacional, prevalência
dos direitos humanos, autodeterminação dos povos, não-intervenção, igualdade
entre os Estados, defesa da paz, solução pacífica dos conflitos, repúdio ao
terrorismo e ao racismo, cooperação entre os povos para o progresso da
humanidade e da concessão de asilo político.
Urge ainda ressaltar,
que os princípios implícitos no direito posto (positivado), denominados pelo
Eminente Professor Eros Roberto Grau como aqueles que, embora nele não expressamente
enunciados, existem, em estado de latência, sob o ordenamento positivo, no
direito pressuposto [2006;161], também possuem caráter normativo. Utilizando-se
de exemplo citado por este mesmo Mestre, ilustra-se tal afirmação a partir do
que dispõe o artigo 93, inciso IX, da Constituição Federal que diz, ipsis
litteris:
"IX - todos os
julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas
todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença,
em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a
estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado
no sigilo não prejudique o interesse público à informação;" (grifamos)
Dessa forma pode-se
extrair deste dispositivo o princípio da motivação do ato administrativo,
o qual consiste na obrigação de os agentes públicos apresentarem por escrito as
razões de fato e base legal que os autorizam a realizar determinada conduta.
Sendo assim, não
restam dúvidas de que os princípios, tanto explícitos quanto implícitos, detêm
caráter normativo, uma vez que regulam o modo de agir de toda uma sociedade.
Entretanto, por serem eles mandamentos a serem seguidos, não podemos
compará-los com as regras, tendo em vista que estas guardam certas peculiaridades
que as diferenciam daqueles, conforme discorremos no tópico que se segue.
I.II. A diferença entre
princípios e regras
Há ainda uma grande
discussão doutrinária acerca das diferenças existentes entre os princípios e as
regras jurídicas. Muitas foram as definições levantadas por vários escritores a
fim de estabelecer tão importante definição, dentre as quais destacamos Robert
Alexy, Ronald Dworkin e Eros Roberto Grau.
Alexy distingue o
princípio da regra jurídica estabelecendo que o primeiro consiste em um
mandamento de otimização, na medida em que o seu cumprimento pode ser realizado
em diferentes graus, dentro das possibilidades reais e jurídicas existentes, ao
passo que as regras só podem ser cumpridas ou não. Neste passo vejamos um
trecho de suas lições, in verbis:
O ponto decisivo para
a distinção entre regras e princípios reside em que os princípios são normas
ordenadoras de que algo se realize na maior medida possível, dentro das
possibilidades jurídicas e reais existentes. Portanto, os princípios são
mandatos de otimização, caracterizados pelo fato de poderem ser cumpridos em
diferentes graus, e a medida do seu cumprimento não depende apenas das
possibilidades reais, mas também das possibilidades jurídicas. O âmbito dessas
possibilidades jurídicas é determinado pelos princípios e regras opostos. As
regras, ao contrário, só podem ser cumpridas ou não. Se uma regra é válida,
então há de se fazer exatamente o que ela exige, nem mais, nem menos.[10]
Continua Alexy
estabelecendo as distinções entre princípios e regras, utilizando-se de uma
segunda premissa que diz que “as regras contêm determinações no âmbito do que é
fática e juridicamente possível. Isto significa que a diferença entre regras e
princípios é qualitativa e não de grau. Toda norma ou é uma regra, ou é um
princípio.”
Ronald Dworkin, por
sua vez, entende que a diferença entre princípios e regras reside no fato de
que estas são aplicadas do modo tudo ou nada, ou seja, no caso de colisão entre
duas regras diante de um determinado caso em concreto, uma delas haverá de ser
válida e a outra inválida, não podendo as duas habitar conjuntamente no
ordenamento jurídico para regular uma mesma situação, não comportando exceções,
salvo se estas estiverem descritas em seu enunciado. Exemplifica o autor esta
situação, descrevendo o seguinte caso hipotético:
"(...) Se a
exigência de três testemunhas é uma regra jurídica válida, nenhum testamento
será válido quando assinado por apenas duas testemunhas. A regra pode ter
exceções, mas se tiver, será impreciso e incompleto simplesmente enunciar a
regra, sem enumerar as exceções. Pelo menos em teoria, todas as exceções podem
ser arroladas e quanto mais o foram, mais completo será o enunciado da
regra." [11]
Os princípios, por
sua vez, diferenciam-se das regras uma vez que suas disposições comportam
exceções mesmo que estas não estejam enumeradas na norma. Quando dois
princípios de contradizem, poderá um ser utilizado e outro ser desconsiderado,
sem que seja colocada em risco a sua validade, podendo, portanto, vir a ser
utilizado em outro momento, conforme ensinamentos de Dworkin.
Há de se mencionar
ainda, que, segundo Dworkin, outro critério diferencia os princípios das regras
jurídicas, qual seja, o da dimensão do peso ou importância. Neste mister, diz o
mestre que quando dois princípios se intercruzam, aquele que vai resolver o
conflito tem que levar em conta a força relativa de cada um [2010;42], ou seja,
o princípio que obtiver maior importância ou relevância jurídica prevalecerá em
detrimento de outro que for menos considerado.
Em comparação com as
regras, Dworkin diz que este critério não pode ser adotado, tendo em vista no
sistema jurídico não existe regra que seja mais importante que outra, de tal
modo que se duas regra se contrapõem, uma suplanta a outra em virtude de sua
importância maior, sendo que somente uma delas terá validade.
Deixando de lado os
critérios adotados por Ronald Dworkin, o Professor e Ex-Ministro do Supremo
Tribunal Federal Eros Roberto Grau, sintetiza a dissociação entre princípios e
regras a partir de três critérios. O primeiro consiste no fato de que as regras
jurídicas são detentoras de maior generalidade, sendo editadas para única e
exclusivamente regular uma situação jurídica determinada, ao contrário dos
princípios que comportam uma série indefinida de aplicações [2006;188].
Em segundo plano, o
critério de diferenciação adotado consiste no mesmo defendido por J.J.
Canotilho, baseando-se em alguns pontos em Alexy e Dworkin, no sentido de que
"os princípios são normas jurídicas impositivas de uma optimização,
compatíveis com vários graus de concretização, consoante os condicionalismos
fáticos e jurídicos as regras são normas que prescrevem imperativamente uma
exigência (impõe, permitem, proíbem) que é ou não é cumprida (nos termos de
Dworkin: applicable in all-or-nothing fashion); a convivência dos princípios é
conflitual (Zagrebelsky); a convivência das regras é antinômica. Os princípios
coexistem; as regras antinômicas excluem-se. [12]
Continua o Eminente
Professor, citando as considerações de Canotilho, seguindo o entendimento de
que os princípios seguem as regras de otimização defendida por Alexy, não
possuindo a lógica "tudo ou nada" adotada por Dworkin, podendo, em
caso de contraposição, serem aqueles resolvidos a partir do critério de peso,
validade e ponderação (importância, ponderação, valia), ao contrário destas que
sendo contraditórias não poderão ser ao mesmo tempo válidas (se elas não são
corretas devem ser alteradas). [2006;186]
O terceiro critério
de dissociação adotado por Eros Grau se concentra no fato de que "a
diferença entre regra e princípio surge exclusivamente no momento da
interpretação/aplicação [Prieto Sanchís e Gianformaggio], de modo que apenas no
curso do processo de interpretação (no perpassar do círculo hermenêutico) o
intérprete poderá decidir-se se há ou não há conflito entre regras ou colisão
entre princípios; ora, se efetivamente é o tipo de oposição (conflito ou
colisão) que define regra e princípio, então apenas no processo de
interpretação poder-se-á operar-se a distinção."
Sendo assim, há de se
atribuir maior crédito para os critérios de diferenciação entre regras e
princípios estabelecidos pelo Douto Professor Eros Roberto Grau, tendo em vista
que o seu modo de analise torna-se mais abrangente e menos radical do que os
demais, estabelecendo com propriedade os pontos culminantes de dissociação
entre as duas normas jurídicas ora em debate.
Por fim, cabe
mencionar que apesar das regras e os princípios jurídicos possuírem diferenças
entre si, eles não perdem o seu caráter de norma jurídica, conforme bem
analisado no tópico anterior, motivo pelo qual fazem parte da teoria
tridimensional do direito desenvolvida por Miguel Reale.
Tal teoria estabelece
que o momento normativo é resultado da tensão existente entre fato
e valor, no sentido de que estes três elementos estão sempre em harmonia
em qualquer momento da vida jurídica, seja ela estudada pelo filósofo ou o
sociólogo do direito, ou pelo jurista como tal, demonstrando-se desta forma a
dialeticidade existente no mundo jurídico. Neste mister, vejamos a explanação
do Professor Miguel Reale, o qual a partir do ano de 1940 revolucionou a
interpretação do direito com o desenvolvimento desta teoria, in verbis:
Como se vê, a Teoria
Tridimensional do Direito e do Estado, tal como a venho desenvolvendo desde
1940, muito embora não empregasse então aquele termo, distingue-se das demais
de caráter genérico ou específico, por ser concreta e dinâmica, isto é, por
afirmar que:
a) Fato, valor e
norma estão sempre presentes e correlacionados em qualquer expressão da vida
jurídica, seja ela estudada pelo filósofo ou o sociólogo do direito, ou pelo
jurista como tal, ao passo que, na tridimensionalidade genérica ou abstrata,
caberia ao filósofo apenas o estudo do valor, ao sociólogo o do fato e ao
jurista o da norma (tridimensionalidade como requisito essencial do direito).
b) A correlação entre
aqueles três elementos é de natureza funcional e dialética, dada a
“implicação-polaridade” existente entre fato e valor, de cuja tensão resulta o
momento normativo, como solução superadora e integrante nos limites
circunstanciais de lugar e de tempo (concreção histórica do processo jurídico,
numa dialética de complementaridade)[13]
Desta forma, não há
dúvidas da importância que esta teoria realeana trouxe para a interpretação do
direito, ampliando a visão de seus operadores para que se perceba que este não
pode ser considerado apenas um sistema meramente lógico e fechado, mas sim
dialético e companheiro do desenvolvimento da vida de uma sociedade, onde as
normas jurídicas (princípios e regras) devem ser vistas, manuseadas e
elaboradas como valorações dos fatos ocorridos no cotidiano da evolução da sociedade.
II. O PRINCÍPIO DA
RAZOABILIDADE
Com efeito, não há
como se falar em aplicação do direito, elaboração de normas, realização de atos
administrativos etc., sem antes se pensar no razoável e no proporcional, pois
são eles que, via de regra, condicionam o correto e o justo modo de agir dos
administradores e dos administrados em uma sociedade.
Entretanto, salvo
melhor juízo, deve-se a razoabilidade sempre ser entendida de modo diverso da
proporcionalidade, pois conforme será analisado no decorrer deste estudo, estes
dois princípios guardam certas peculiaridades que os diferenciam um do outro.
Segundo as concepções
do Magistrado Dirley da Cunha Júnior, o qual defende a igualdade destes
princípios, o conceito de razoabilidade surgiu há muitos anos atrás, tendo sua
origem e desenvolvimento ligados à garantia do devido processo legal, antigo
instituto do direito anglo-saxão, que remonta a clausula Law of the land
inscrita na Magna Carta de 1215, desenvolvendo-se também mais tarde nos Estados
Unidos com um aspecto muito mais substantivo ou material (“substantive due
process of law”), para permitir ao Judiciário investigar o próprio mérito
dos atos do poder público, a fim de verificar se esses atos são razoáveis, ou
seja, se estão conforme a razão, supondo equilíbrio, moderação e harmonia.[14]
Dessa forma,
depreendemos que o princípio da razoabilidade seria um regulador dos atos
administrativos, sendo utilizado para que a realização destes possa se dar de
forma compatível com o fim que se almeja alcançar, sem quaisquer tipos de
exageros que venham a macular o ato.
Ocorre que, permissa
venia, tal definição carece de certo aprofundamento teórico, na medida em que
se poderá realmente confundi-lo com o princípio da proporcionalidade, caso
venha a ser adotado.
O Professor José
Roberto Pimenta de Oliveira define “o princípio da razoabilidade, no contexto
jurídico-sistemático da busca do interesse público primário, a exigência de
justificada e adequada ponderação administrativa, aberta nos exatos limites
constitucionais em que a regra de competência habilitadora autorizar, dos
princípios, valores, interesses, bens ou direitos consagrados no ordenamento
jurídico, impondo aos agentes administrativos que maximize a proteção jurídica
dispensada para cada qual, segundo o peso, importância ou preponderância que
venham adquirir e ostentar em cada caso objeto de decisão.”
Depreende-se do
parágrafo anterior, que para o autor a aplicação do princípio da razoabilidade
funciona com base nas dimensões de ponderação entre valores principiológicos,
jurídicos e morais, em relação a cada caso em específico dos administrados.
Conforme se verifica,
muitos são os doutrinadores que tentam definir a razoabilidade, entretanto,
Humberto Bergman Ávila, debruçando-se no estudou do tema, aprofundou sua
pesquisa sobre este princípio e com detalhes definiu as três acepções que
possibilitam sua melhor compreensão, quais sejam: equidade, congruência e
equivalência.
II.I. O princípio da
razoabilidade como equidade
Como se viu até o
momento, a razoabilidade, em suma, é utilizada como instrumento do controle do
exercício, pela administração Pública, de discricionariedade.[15]
Mas para que este
controle seja realizado corretamente, visando atingir a sua finalidade, há de
se observar o critério de equidade estabelecido por Humberto Ávila, o qual
segundo ele consiste, em um primeiro momento, na harmonização da norma geral
com o caso individual [2009;152].
Pode-se depreender
desta premissa, que toda norma foi editada para regular determinada situação ou
situações da vida do indivíduo em uma sociedade. Entretanto, não se pode
aplicar uma regra a um caso que guarda relação com seu âmbito de abrangência,
sem se analisar as peculiaridades da situação em concreto.
Ora, existirão
exceções para a aplicação de uma regra que não estarão contidas em seu bojo,
podendo, somente o administrador percebê-las no momento em que analisar as
minúcias específicas de dada situação, onde só então perceberá que a aplicação
da norma naquela situação não seria razoável, devendo esta, portanto, ser
afastada.
Exemplificando esta
situação, utilizamo-nos de exemplo dado por Ávila citando um caso julgado pelo
Supremo Tribunal Federal, em que um advogado requereu o adiantamento do
julgamento perante o Tribunal do Júri porque era defensor de outro caso
rumoroso que seria julgado na mesma época. O primeiro pedido foi deferido.
Depois de defender seu cliente, e diante da recomendação de repouso por duas
semanas, o advogado requereu novo adiamento do julgamento. Nesse caso, porém, o
julgador indeferiu o pedido, por considerar o adiamento um descaso para com a
justiça, presumindo que o advogado estava pretendendo, de forma maliciosa,
postergar indevidamente o julgamento. Na data marcada para o julgamento, e
mesmo após o réu afirmar que seu advogado não estava presente, o
Juiz-Presidente nomeou advogado dativo, que logo assumiu a defesa. Inconformado
com o indeferimento do pedido e com o próprio resultado do julgamento, o
advogado impetrou habeas corpus. Na decisão asseverou-se não parecer fora de
razoabilidade que o advogado, que patrocinava causas complexas, cujo julgamento
estava ocorrendo com certa contemporaneidade, pudesse pedir o adiamento em
razão do que ocorrera no julgamento anterior. Enfim, afirmou-se que é razoável
presumir que as pessoas dizem a verdade e agem de boa-fé, em vez mentir ou agir
de má-fé. Na aplicação do Direito deve-se presumir o que normalmente acontece,
e não o contrário. A defesa apresentada pelo advogado dativo foi considerada
nula, em razão de o indeferimento do pedido de adiamento do julgamento feito
pelo advogado ter cerceado o direito de defesa do réu.[16](STF, 2ª
Turma, HC 71.408-1-RJ, rel. Min. Marco Aurélio, j. 16.8.1999, DJU 29.10.1999.)
Dessa forma,
percebemos que as circunstâncias de fato levam ao aplicador do direito perceber
que em determinados casos é razoável abrir mão da letra morta da regra, para
que a distribuição da justiça seja perfeita sob a luz de outras normas
existentes no mundo jurídico, sob pena de se obter uma aplicação irracional do
direito.
Explanando com
excelência esta definição, Humberto Ávila diz que “a razoabilidade atua como
instrumento para determinar que as circunstâncias de fato devem ser
consideradas com a presunção de estarem dentro da normalidade. A
razoabilidade atua na interpretação dos fatos descritos em regras jurídicas.
A razoabilidade exige determinada interpretação como meio de preservar a
eficácia de princípios axiologicamente sobrejacentes. Interpretação diversa das
circunstâncias de fato levaria à restrição de algum princípio constitucional.”[17]
(grifamos)
Neste diapasão, o
saudoso Professor Diógenes Gasparini, definindo o princípio da razoabilidade
diz que, in verbis:
“O particular, salvo
alguma anomalia, não age de forma desarrazoada. Seu comportamento, diante das
mais variadas situações, predispõe-se, sempre a seguir o sentido comum das
pessoas normais. Assim também deve ser o comportamento da Administração Pública
quando estiver no exercício de atividade discricionária, devendo atuar
racionalmente e afeiçoada ao senso comum das pessoas, tendo em vista a
competência recebida para a prática, com discrição, de atos administrativos.” [18]
Dessa forma, podemos
entender que a razoabilidade como equidade significa a harmonização da escolha
de uma norma para sua aplicação em um determinado caso em concreto,
respeitando-se as peculiaridades específicas deste caso, e ponderando sua
utilização de forma a suavizar a colisão da norma com fato de maneira a
otimizar sua aplicação, produzindo com excelência os resultados que realmente o
legislador ao editar a norma pretendia alcançar.
Passado este ponto,
em um segundo momento, Ávila diz que a razoabilidade como equidade exige a
consideração do aspecto individual do caso nas hipóteses em que ele é sobremodo
desconsiderado pela generalização legal. [2009;154]
Isto significa dizer,
que a aplicação de uma regra não esta vinculada única e exclusivamente à
generalidade dos casos de sua abrangência ou porque as suas hipóteses de
incidência foram preenchidas. Deverá, portanto, ser obrigatoriamente observado
o fato de que se sua aplicação não é excluída pela razão motivadora da própria
regra ou pela existência de um princípio que institua uma razão contrária.
Nessas hipóteses as condições de aplicação da regra são satisfeitas, mas a
regra, mesmo assim, não é aplicada.[19]
Sendo assim,
entende-se que as regras são elaboradas a fim de regularem casos futuros na
vida de indivíduos de uma sociedade, porém, o legislador não consegue prever
todos os casos em que a regra terá aplicação, inclusive as exceções em que esta
não deverá incidir momento em que o aplicador do direito deverá observar os
fatos conjuntamente com as normas, a fim de verificar qual seria o modo mais
razoável de distribuição do direito, podendo até mesmo afastar, caso haja
necessidade, a incidência da norma, a luz do princípio da razoabilidade por
equidade.
II.II. O princípio da
razoabilidade como congruência
O princípio da
razoabilidade como congruência, segundo Humberto Ávila, deve ser entendido de
duas formas, como correlação entre a aplicação de normas e o contexto social em
que ela será aplicada, bem como entre a correlação entre o critério de
diferenciação e a medida adotada.
Em primeiro plano,
trabalha-se com a idéia de que não pode a norma regular determinada situação
que esteja aquém das necessidades da sociedade, ou que esteja em
desconformidade com a realidade social.
Vejamos um julgado do
Supremo Tribunal Federal citado por Ávila, o qual narra o fato de que uma lei
estadual instituiu adicional de férias de um - terço para os inativos. Levada a
questão a julgamento, considerou-se indevido o referido adicional, por traduzir
uma vantagem destituída de causa e do necessário coeficiente de razoabilidade,
na medida em que só deve ter adicional de férias quem tem férias. Como
consequência disso, a instituição do adicional foi anulada, em razão de violar
o devido processo legal, que atua como decisivo obstáculo à edição de atos
legislativos de conteúdo arbitrário ou irrazoavel.
Do exemplo
supracitado, vemos que faltou um motivo plausível que justificasse a
Administração Pública conceder adicional de férias aos funcionários inativos.
Ora, tal medida foi tomada em desconformidade com a realidade e necessidade
social, tendo em vista que não há o porquê conceder este benefício a profissionais
que não tiram mais férias, devido à sua inatividade, existindo, portanto,
flagrante falta de razoabilidade na medida adotada em relação às condições
externas de aplicação, que é o interessa à razoabilidade por congruência.
Humberto Ávila diz
que os princípios constitucionais do Estado de Direito (art. 1º) e do devido
processo legal (art. 5º, LIV) impedem a utilização de razões arbitrárias e a
subversão dos procedimentos institucionais utilizados. Desvincular-se da
realidade é violar os princípios do Estado de Direito e do devido processo
legal.
Neste mister, o
Professor José Roberto Pimenta Oliveira, citando Maria Sylvia Zanella Di Pietro
e Ana Paola Lorenzo orienta, ad litteram:
“Maria Sylvia Zanella
Di Pietro, dentre um dos significados do princípio, averba que deve
considerar-se irrazoável ‘a medida arbitrária, assim entendida aquela que é
adotada por capricho, por motivos pessoais ou sem um motivo preciso que possa
ter embasamento na ordem jurídica’. Para Ana Paola Lorenzo, o escopo da
razoabilidade é ‘impedir o arbítrio, ou seja, a submissão do poder à razão’.”[20]
Em segundo plano,
temos que fere o princípio da razoabilidade por congruência a diferenciação
inadequada utilizada pela norma em relação à medida por ela adotada.
Neste mister, urge
trazer à balha exemplo em que o Supremo Tribunal Federal julgou desarrazoada a
exigência de altura mínima para o cargo de escrivão de polícia, tendo em vista
a natureza eminentemente burocrática da função a ser exercida, para o qual o
porte físico é irrelevante.[21]
Sendo assim, temos
que o princípio da razoabilidade serve de parâmetro para a observância da
isonomia, tendo em vista que se o meio de diferenciação para a aplicação de
norma for carente de embasamento lógico, haverá consequente irrazoabilidade na
medida que por ela será imposta.
II.III. O princípio da
razoabilidade como equivalência
A razoabilidade como
equivalência, por sua vez, relaciona-se ao fato de equivalência entre a medida
adotada e o critério que a dimensiona.[22]
Trabalha-se aqui com
critérios de ponderação entre o meio adotado e a finalidade a ser atingida.
Neste Mister, a Ministra do Supremo Tribunal Federal “Cármem Lúcia Antunes
Rocha, a acepção restrita da razoabilidade (que a distingue da
proporcionalidade) obtém-se ‘como a qualidade dos valores buscados pela conduta
estatal ou como o fundamento do valor Justiça que ela deve realizar e a coerência,
racionalmente demonstrada, entre aquele desempenho e a transformação da
realidade por ela provocada e que deve ser justa e concretizadora do
interesse público específico para ser considerada válida juridicamente’.”[23]
Um exemplo simples
que nos permite compreender com mais clareza tal definição vem do direito
penal, a partir do chamado “princípio da insignificância” ou “bagatela”, o qual
diz que não haverá incriminação para agentes que cometem crimes incapazes de
lesar um bem jurídico tutelado. Desta forma, consoante entendimento recente do
Supremo Tribunal Federal[24], não seria equivalente a aplicação de
pena em um caso de furto de bem patrimonial avaliado em R$ 100,00 (cem reais),
tendo em vista o mínimo de grau de lesividade constante na conduta do agente.
Conclui-se de todo o
exposto que a razoabilidade como equivalência exige uma simetria justa entre
uma medida a ser adotada em relação ao fim onde esta será aplicada.
III. O PRINCÍPIO DA
PROPORCIONALIDADE
Diferentemente do
princípio da razoabilidade, as primeiras noções de proporcionalidade surgiram
com o direito alemão e prussiano na transição do século XVIII para o século
XIX, a fim de que fosse limitado o poder de polícia da Administração Pública em
sua atuação, com base nos ideais liberais e de superação da era absolutista.
Acerca deste assunto,
o Professor Paulo Bonavides disserta com propriedade assinalando que, ad
litteram:
“Vinculada ao Direito
de Polícia e à jurisdição administrativa, a teoria da proporcionalidade vingou
primeiro na Prússia, onde alcançou certa maturidade e dali se dilatou aos
demais Estados alemães.
Mas foi depois da
segunda Grande Guerra Mundial, após o advento da Lei fundamental, e, sobretudo
com a jurisprudência do Tribunal Constitucional, que o princípio da
proporcionalidade logrou, tanto na Alemanha como na Suíça, uma larga aplicação
de caráter constitucional, em mais de 150 arestos, conforme assinalou Klaus Stern.”[25]
(grifamos)
Do exposto acima,
pode-se afirmar que a proporcionalidade é uma derivação do Direito
Administrativo, a qual assumiu importância no âmbito constitucional com o
Tribunal Constitucional Alemão, regulando a aplicação dos direitos e garantias
fundamentais, a partir dos ideais de Direitos Humanos surgidos após a Segunda
Guerra Mundial.
A partir de então,
este princípio vem crescendo em importância e aplicação até os dias atuais, na
medida em que é usado constantemente pelos operadores do direito brasileiro nas
áreas relacionadas ao Direito Administrativo, Constitucional, Penal, Eleitoral,
Tributário e Processual, como forma de limitação da atuação do Poder Público e
controle na aplicação dos direitos e garantias fundamentais.
Dessa forma, será
objeto de estudo neste capítulo com mais profundidade as características deste
princípio, o qual é basicamente fundado na relação de causalidade existente
entre um meio e um fim a ser atingido, ou seja, o princípio da
proporcionalidade exige a melhor escolha de um meio para que determinado fim
seja alcançado. Todavia, para que a escolha deste meio seja juridicamente
correta, necessária se faz a observância de três subprincípios, quais sejam:
adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito, conforme
demonstrado nas linhas que se seguem.
III.I. Adequação
O critério de
adequação do princípio da proporcionalidade significa que o meio escolhido deve
ser suficientemente apropriado para que um fim seja atingido, ou seja, não há
em um primeiro momento a preocupação de que este meio utilizado seja o melhor
possível, mas que apenas seja bom o bastante para que se possa alcançar o
objetivo almejado.
Analisando esta
máxima, Humberto Ávila chegou à conclusão de que não é obrigatório que o
legislador e a Administração escolham o meio mais intenso, melhor ou mais
seguro para atingir um fim, mas que simplesmente escolham um meio que promova o
fim, tendo em vista que (i) nem sempre é possível saber qual é o mais intenso,
melhor e mais seguro meio na realização de um fim, (ii) que tal dever limitaria
a atuação da Administração ferindo o princípio da separação dos Poderes (o qual
exige respeito à vontade do Poder Legislativo e do Poder Executivo), (iii) bem
como que a imediata exclusão de um meio que não é o mais intenso, melhor e o
mais seguro para atingir o fim impediria a consideração a outros argumentos que
poderiam justificar com excelência a escolha.[26]
Dessa forma,
verifica-se por ora que a Administração e os legisladores detêm em suas mãos a
discricionariedade de atuar com liberdade na escolha de um meio que venha a
promover determinado fim, não sendo obrigados a deduzir todas as hipóteses em
que este meio seja compatível ou não com o interesse primário, mas que tão
somente seja apropriado para o alcance de um fim desejado.
III.II. Necessidade
Com base neste
subprincípio da necessidade, tem-se que o Poder Público, quando na escolha do
meio, deve preocupar-se em adotar dentre os possíveis aquele que cause à
coletividade uma menor desvantagem no que concerne à restrição dos direitos
fundamentais.
Neste passo, José
Roberto Pimenta Oliveira orienta que “medidas idôneas para o alcance de certo
fim podem, todavia, revelar-se indevidamente onerosas e opressoras, se
comparáveis a outras com similar adequabilidade. Disso exsurge o dever de
necessidade das medidas estatais. Verificada a adequação, somente se legitima o
provimento estatal que, dentre os vários existentes e dotados de mesma
eficácia, representar o meio menos oneroso ou lesivo.”[27]
Destarte, necessário
se faz observar se um meio escolhido para o alcance de determinado fim não será
extremamente oneroso para os direitos fundamentais, devendo o aplicador do
direito, neste caso, escolher outro modo de atingir seus objetivos que seja
possível, de igual potência que o outro, mas que preserve o máximo de direitos
e garantias fundamentais possíveis.
III.III.
Proporcionalidade em sentido estrito
A proporcionalidade
em sentido estrito, ou stricto sensu, é o último dos subprincípios da proporcionalidade
que estudaremos. Este, por sua vez, traduz à idéia de que o meio somente não
será desproporcional se as desvantagens que ele ocasionar não virem a superar
as vantagens que ele deveria trazer.
Neste mister, o
Professor J.J Gomes Canotilho leciona que, in verbis:
“Quando se chegar à
conclusão da necessidade e adequação da medida coactiva do poder público para
alcançar determinado fim, mesmo neste caso deve perguntar-se se o resultado
obtido com a intervenção é proporcional à carga coactiva da mesma. Está aqui em
causa o princípio da proporcionalidade em sentido estrito, entendido como o
princípio da “justa medida”. Meios e fim são colocados em equação mediante um
juízo de ponderação, com o objetivo de se avaliar se o meio utilizado é ou não
desproporcionado em relação ao fim. Trata-se, pois, de uma questão de medida ou
desmedida para se alcançar um fim: pesar as desvantagens dos meios em relação
às vantagens do fim.”[28]
Desta forma, o que
ocorre é um exame dos direitos fundamentais que serão descartados na adoção de
uma medida em comparação com os que serão conquistados por ela, devendo estes
últimos se sobressair perante os primeiros, em vista do que determina a
proporcionalidade em sentido estrito.
IV. DIFERENÇAS ENTRE OS
PRINCÍPIOS DA RAZOABILDADE E DA PROPORCIONALIDADE
Com efeito, até o
momento pôde-se analisar no decorrer deste estudo as peculiaridades dos
princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. Entretanto, nos ateremos
doravante a demonstrar as diferenças entre estas normas.
No Brasil, ainda não
há um posicionamento concreto acerca da correta definição e aplicação dos
princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. Muitos doutrinadores
defendem a tese de que se tratam de meros sinônimos, outros, que são normas
jurídicas distintas, sendo esta confusão feita até mesmo no Supremo Tribunal
Federal.
Dessa forma, é
relevante para o presente estudo a exposição de algumas destas teorias com seus
respectivos escritores, a fim de que se possa desenvolver um parâmetro para
análise e reflexão.
O Professor e
Ministro do Supremo Tribunal Federal Gilmar Mendes, é participante da corrente
doutrinária que defende a similaridade dos princípios ora em questão,
destacando suas funções como se uma só fossem, in verbis:
“Utilizado, de
ordinário, para aferir a legitimidade das restrições de direitos – muito embora
possa aplicar-se, também, para dizer do equilíbrio na concessão de poderes,
privilégios ou benefícios – o princípio da proporcionalidade ou da
razoabilidade, em essência, consubstancia uma pauta de natureza axiológica
que emana diretamente das idéias de justiça, equidade, bom senso, prudência,
moderação, justa medida, proibição de excesso, direito justo e valores afins;
precede e condiciona a positivação jurídica, inclusive a de nível
constitucional; e, ainda, enquanto princípio geral do direito, serve de regra
de interpretação para todo o ordenamento jurídico.” (grifamos)
Neste mesmo diapasão,
Luís Roberto Barroso afirma que "é digna de menção a ascendente
trajetória do princípio da razoabilidade, que os autores sob influência
germânica preferem denominar princípio da proporcionalidade, na
jurisprudência constitucional brasileira." [29]
Nota-se nitidamente
nos trechos acima que para os autores os princípios em comento são meros
sinônimos, sendo correta em suas visões, portanto, a utilização terminológica
de qualquer dos dois princípios, chegando até ser afirmado pelo Professor Luís
Roberto que a proporcionalidade é apenas uma denominação alemã de
razoabilidade.
Dessa forma, a partir
destas considerações, percebe-se que para essa corrente doutrinária não há
distinções entre os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, vindo
estes a serem meros sinônimos.
Entretanto, mesmo
que estes princípios venham a ter objetivos praticamente semelhantes, isso não
autoriza o tratamento de ambos como sinônimos. Portanto, existe uma outra
corrente doutrinária que defende a distinção entre a razoabilidade e a
proporcionalidade.
Neste mister,
criticando as considerações acima, e mais especificamente a de Luís Roberto
Barroso, o Ilustre Professor Willis Santiago Guerra Filho, em artigo denominado
“Noções Fundamentais sobre o Princípio Constitucional da Proporcionalidade”
observa que, ipsis litteris:
“Dissentimos,
contudo, em ponto fundamental, a saber, quando se identifica os princípios da
proporcionalidade e da razoabilidade, reconduzindo a ambos ao aspecto
substancial do devido processo legal, quando só este último é que, a rigor,
assim poderia ser enquadrado, não o primeiro, que é garantia fundamental, com
natureza processual.
(...)
Descabida, portanto,
como pretende LUÍS ROBERTO BARROSO (sic.) (1996, p. 204), é a ‘fungibilidade’
entre os princípios da razoabilidade, que é uma vedação do que se perpetre
absurdos com o direito, e o da proporcionalidade, que é uma exigência de
racionalidade, pressuposto já da razoabilidade.” [30] (grifamos)
Verifica-se que para
este nobre doutrinador o princípio da razoabilidade é aplicado para regular o
devido processo legal, evitando-se desta forma a utilização irrazoada do
direito, ao passo que a proporcionalidade tem a função de otimizar a aplicação
dos direitos e garantias fundamentais. Dessa forma, se pode concluir que para o
autor o manuseio da proporcionalidade começa após o da razoabilidade.
Seguindo esta mesma
corrente, mas realizando uma distinção mais teórica entre estes os dois
princípios, o Professor Humberto Ávila diz que a proporcionalidade “aplica-se
nos casos em que exista uma relação de causalidade entre um meio e um fim
concretamente perceptível. A exigência de realização de vários fins, todos
constitucionalmente legitimados, implica a adoção de medidas adequadas,
necessárias e proporcionais em sentido estrito.” Ao passo que a razoabilidade
deve ser aplicada sob três aspectos: “primeiro, como diretriz que exige a
relação das normas gerais com as individualizadas do caso concreto, quer
mostrando sob qual perspectiva a norma deve ser aplicada, quer indicando em
quais hipóteses o caso individual, em virtude de suas especificidades, deixa de
se enquadrar na norma geral. Segundo, como diretriz que exige uma vinculação
das normas jurídicas com o mundo ao qual elas fazem referência, seja reclamando
a existência de um suporte empírico e adequado a qualquer ato jurídico, seja
demandando uma relação congruente entre a medida adotada e o fim que ela
pretende atingir. Terceiro, como diretriz que exige a relação de equivalência
entre duas grandezas.”[31]
Do exposto acima, a
distinção entre proporcionalidade e razoabilidade consiste no fato de que o
primeiro está relacionado ao critério de meio e fim, na medida em que o meio
adotado deverá obedecer aos critérios de adequação, necessidade e
proporcionalidade em sentido estrito para que a exigência de realização do fim
seja atingida. Em contrapartida, na opinião do autor o segundo significa a
relação de equivalência entre duas grandezas, sendo a razoabilidade como
diretriz que exige a relação das normas gerais com as individualizadas do caso
concreto ou como diretriz que exige uma vinculação das normas jurídicas com o
mundo ao qual elas fazem referência.
No âmbito histórico
também é possível identificar as distinções entre o princípio da razoabilidade
e da proporcionalidade, mostrando-se, conforme a maneira em que surgiram, que
seu modo de aplicação deve ser realizado em momentos distintos, pois um serve
como parâmetro para aplicação do princípio do devido processo legal
(razoabilidade), e outro como forma de otimização da aplicação dos direitos e
garantias fundamentais (proporcionalidade), conforme já mencionado acima.
Neste mister, o
Professor Virgílio Afonso da Silva aponta que a “regra da proporcionalidade no
controle das leis restritivas de direitos fundamentais surgiu por
desenvolvimento jurisprudencial do Tribunal Constitucional alemão e não é uma
simples pauta que, vagamente, sugere que os atos estatais devem ser razoáveis,
nem uma simples análise da relação meio-fim. Na forma desenvolvida pela
jurisprudência constitucional alemã, tem ela uma estrutura racionalmente definida,
com sub-elementos independentes - a análise da adequação, da necessidade e da
proporcionalidade em sentido estrito - que são aplicados em uma ordem
pré-definida, e que conferem à regra da proporcionalidade a individualidade que
a diferencia, claramente, da mera exigência de razoabilidade.”[32]
Desta forma, podemos
depreender de todo o acima exposto que os princípios da razoabilidade e da
proporcionalidade devem ser encarados de maneira que os dissociem um do outro,
tanto em relação ao seu momento correto de aplicabilidade, uma vez que a
razoabilidade antecede a proporcionalidade, quanto em relação a seus aspectos
teóricos e históricos, os quais por si só demonstram que seus nascimentos se
deram de forma e motivos diferenciados.
IV.I. Dos princípios da
razoabilidade e da proporcionalidade na jurisprudência do Supremo Tribunal
Federal
Ao se analisar os
julgados do Supremo Tribunal Federal, se percebe que existe uma confusão na
aplicação dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. Ora eles são
aplicados de maneira correta, ora são aplicados como se fossem apenas um, não
havendo qualquer critério por parte dos Ministros na utilização destas normas.
Exemplo disto é a
Ação Direta de Inconstitucionalidade n.º 2435 MC / RJ de relatoria da Ministra
Ellen Gracie, proposta pela Confederação Nacional do Comércio, a qual impugnava
a Lei n.º 3.542/01, do Estado do Rio de Janeiro, que obrigou farmácias e
drogarias a conceder descontos a idosos na compra de medicamentos, sob pena de
multa no importe de 5.000 UFIRs em caso de descumprimento.
O Ministro Marco
Aurélio entendeu pela Inconstitucionalidade da lei combatida acreditando que
ela feria o princípio da proporcionalidade, tendo em vista que além de
favorecer os idosos com poucos recursos financeiros, também favoreceria aqueles
que não precisam desta ajuda financeira por terem uma boa condição de vida.
Entretanto, ao
proferir o seu voto utilizou-se da proporcionalidade e razoabilidade como se
fossem o mesmo instituto jurídico, sem se preocupar em demonstrar qualquer
critério de distinção entre os dois ou até mesmo fazer uma análise de aplicação
dos subprincípios a eles inerentes, para que assim pudesse realizar a aplicação
correta destas duas normas.
Vejamos um trecho de
seu voto, o qual demonstra nitidamente a afirmação acima realizada:
“Vou pedir vênia à
Ministra Ellen Gracie para adotar uma posição antipática àqueles que contam com
mais de sessenta anos de idade. (...) Por estar convencido da falta de
proporcionalidade e – perdoem-me, já que se trata de um instituto jurídico – de
razoabilidade da norma. (...).”
Sendo assim,
percebe-se que o Eminente Ministro aplicou a proporcionalidade como se fosse a
razoabilidade, não explicando o significado destes institutos, utilizando-os
como se um só fossem.
Em outro caso em que
fora julgado Recurso de Agravo Regimental em sede de Suspensão de Segurança, o
qual fora atuado sob o n.º 4.363/TO, de relatoria do Ministro Presidente Cezar
Peluso, os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade também foram
aplicados como sinônimos.
O Estado de Tocantins
interpôs aludido o recurso em vista da decisão que negou provimento ao seu
pleito de suspensão de segurança, o qual tinha a finalidade de sustar a
execução de acórdão proferido no Tribunal de Justiça daquele estado (Apelação
Cível n.º 0140633-18.2010.8.26.0000), que suspendeu os efeitos das Portarias nº
168 e nº 172, publicadas no DOE de 16/02/2011, que determinaram a remoção de
delegados e agentes da Polícia Civil e agentes penitenciários estaduais para
outras localidades.
Apesar das alegações
do Estado de Tocantins, de que referidos expedientes administrativos foram
realizados com base nos critérios de conveniência e oportunidade da
Administração Pública, o Eminente Ministro relator Cezar Peluso negou
provimento ao recurso, com base nos seguintes fundamentos, in verbis:
“Inconsistente o
recurso.
Como destaquei no
despacho que proferi em 12.4.2011, o Secretário de Estado de Segurança, Justiça
e Cidadania do Tocantins, ao prestar informações nos mandados de segurança originários,
informou que, a partir de janeiro de 2011, início de novo Governo, a Secretaria
de Segurança iniciou processo de reestruturação, citando que em vários
municípios não havia Delegado de Polícia. Por outro lado, a leitura das
decisões proferidas pelo Tribunal de Justiça local naqueles autos evidenciam
que o fundamento da concessão das seguranças fora a ausência de motivação
fática para as remoções questionadas. Logo, o agravante não logrou convelir os
fundamentos da decisão agravada, cujo teor subsiste invulnerável aos argumentos
do recurso, os quais nada acrescentaram à compreensão e ao desate da quaestio
iuris. Não se nega com isso ao gestor ou administrador públicos, o juízo de
conveniência e oportunidade para movimentar o funcionalismo público como melhor
lhe convier. Mas sempre caberá ao Poder Judiciário a análise e apreciação do
ato administrativo alegadamente exarado com desvio de finalidade ou abuso de
poder e em desrespeito aos princípios da proporcionalidade e
razoabilidade. (...) 2. Ante o exposto, nego provimento ao recurso.”
(grifamos)
Conforme se observa
no voto acima colacionado, o Ministro utilizou-se da proporcionalidade e
razoabilidade para fundamentar sua decisão, entretanto, não se preocupou em
realizar uma análise para saber qual dos dois princípios era o mais correto a
ser aplicado ao presente caso em concreto.
Vemos que os
princípios em comento foram utilizados como forma de frear os abusos dos atos
do Poder Público, não bastando como fundamento apenas o juízo de
discricionariedade e oportunidade da Administração Pública para a remoção dos
policias de suas lotações, devendo, portanto, ser realizada uma análise de
proporcionalidade em sentido estrito, para saber se as vantagens superariam as
desvantagens que seriam trazidas para os administrados com as mudanças
realizadas. Este seria o princípio mais correto a ser aplicado ao presente
caso.
Sendo assim, pode-se
observar que o Supremo Tribunal Federal ainda possui uma certa inexatidão
quando se trata da aplicação da razoabilidade e da proporcionalidade, tendo em
vista que estas normas são utilizadas pelos Eminentes Ministros daquele
sodalício como se possuíssem o mesmo significado e a mesma função, o que não
condiz com a realidade.
Destaca-se por
derradeiro que em seus votos, os Ministros não realizam uma análise dos
subprincípios da razoabilidade e da proporcionalidade para saber em qual caso
seria realmente correto aplicar um ou outro princípio, o que na regra geral,
inviabilizaria suas utilizações com excelência.
V. CONCLUSÕES
Com efeito, o
presente estudo teve como escopo analisar as minúcias e as peculiaridades dos
princípios do direito, com mais especificidade aos princípios da razoabilidade
e da proporcionalidade.
Procurou-se num
primeiro momento, realizar uma análise dos princípios em geral, estabelecendo
um parâmetro de definição com base na opinião de doutrinadores nacionais e
internacionais, para que após fosse analisada a normatividade dos princípios,
os quais alcançaram tal patamar de importância em vista de sua grande
relevância na seara do direito.
Posteriormente,
viu-se que os princípios diferem-se das regras do direito, pois apesar de ambos
serem normas jurídicas, existem critérios que os diferenciam uns dos outros.
Com base nas idéias mais abrangentes e menos radicais do Professor Eros Roberto
Grau, conclui-se que os princípios se diferenciam das regras de três formas:
(i) grau de generalidade, na medida em que os princípios comportam inúmeras
aplicações, ao passo que as regras são editadas apenas para regular situações
concretas e definidas; (ii) capacidade de otimização dos princípios, uma vez
que em caso de conflito estes se completam harmonicamente, ao contrário das
regras que se excluem, com base no critério “tudo ou nada” de Ronald Dworkin; (iii)
e por fim, no que concerne ao momento da interpretação/aplicação, tendo em
vista que se efetivamente é o tipo de oposição (conflito ou colisão) que define
regra e princípio, então apenas no processo de interpretação é que se poderá
realizar a distinção destas normas.
Passado este ponto
introdutório, pôde-se adentrar com maior segurança e propriedade no mérito do
presente trabalho, qual seja, no estudo dos princípios da razoabilidade e da
proporcionalidade, estabelecendo suas diferenças e analisando o modo correto de
aplicação destes princípios, tendo em vista que muitas das vezes são utilizados
e aplicados pelos operadores do direito, como se fossem o mesmo instituto
jurídico, o que na verdade não são.
Conforme analisado, o
próprio surgimento da razoabilidade na esfera jurídica se deu de maneira
diversa da proporcionalidade, tendo em vista que aquela nasceu com a
jurisprudência inglesa ou norte-americana com desenvolvimento voltado à
garantia do devido processo legal, a fim de permitir ao Poder Judiciário a
investigação dos atos do Poder Público com maior equilíbrio moderação e
harmonia, e esta com o direito Alemão e Prussiano, com primeiro enfoque no
âmbito do Direito Administrativo, limitando o poder de polícia da Administração
Pública, e, posteriormente, se incorporando ao Direito Constitucional, a fim de
regular a aplicação dos direitos e garantias fundamentais, a partir dos ideais
de Direitos Humanos surgidos após a Segunda Guerra Mundial.
Pode-se, outrossim,
verificar que os subprincípios da razoabilidade (equidade, congruência e
equivalência) e da proporcionalidade (adequação, necessidade e
proporcionalidade em sentido estrito), também servem de critério de
diferenciação, além de estabelecer um modo mais preciso de aplicação destas
duas normas jurídicas.
Ao fim, os princípios
da razoabilidade e da proporcionalidade foram analisados à luz do Supremo
Tribunal Federal, o qual em seus julgados não os conceitua de forma isonômica e
precisa, sendo que na maioria dos casos ambos são utilizados e aplicados como
se tivessem o mesmo significado, não havendo qualquer parâmetro de dissociação
entre eles, bem como aplicando-os ao mesmo tempo para regular uma mesma
situação em concreto.
Desta forma, não
restam dúvidas de que a razoabilidade e a proporcionalidade são institutos
diferentes, devendo, portanto, serem assim encarados, para que seja realizada
uma correta interpretação e coerente aplicação do direito, evitando-se assim o
uso desnecessário e inapropriado destes tão importantes princípios.
O manuseio errôneo e/ou
insuficiente dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade gera
consequente perda em segurança jurídica, principalmente nas decisões proferidas
pelo do Supremo Tribunal Federal, o qual constantemente enfrenta questões
relacionadas ao controle de constitucionalidade das normas, e se baseia nos
princípios em comento para fundamentar seus acórdãos.
A aplicabilidade das
normas aqui estudadas exige cuidado e atenção, pois se utilizadas de maneira
correta oferece ao operador do direito a possibilidade de sopesar os meios
utilizados em relação aos fins que pretende atingir, fazendo uma análise de
perda e ganho em direitos fundamentais, apoiando-se inclusive nos direitos já
ponderados pelo Poder Legislativo no momento em que editou determinada norma jurídica,
consagrando a harmonização dos Poderes da União prevista no artigo 2º da
Constituição Federal.
Sendo assim, pode-se
afirmar que a sociedade espera do Poder Judiciário e de seus aplicadores uma
demonstração de credibilidade e segurança, e tais objetivos somente serão
alcançados com excelência quando as decisões e os requerimentos judiciais forem
realizados com a devida coerência, com decisões que demonstrem fundamentos
profundos e bem sopesados, e para que isso aconteça, um dos requisitos
necessários é a correta aplicação dos princípios da razoabilidade e da
proporcionalidade.
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Notas
[1] DWORKIN, Ronald. Levando os Direitos a Sério (Taking
Rights Seriously). São Paulo: WMF Martins Fontes, 2010, 42/43
[2] ALEXY Robert apud Dirley da Cunha JÚNIOR. Curso de
Direito Constitucional. 5ª Edição, Bahia: Editora Jus Podivm, 2011, p. 155.
[3]ALEXY apud ÁVILA, Humberto. Teoria dos princípios da
definição à aplicação dos princípios jurídicos. 9ª Edição, São Paulo:
Malheiros, 2009, p. 52/53
[4]BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional.
19ª edição, São Paulo: Malheiros, 2006, p. 255/256.
[5]ESSER apud ÁVILA, Op. Cit., p. 35.
[6]LARENZ apud ÁVILA, Op. Cit. p. 35.
[7]ÁVILA, Op. cit., 78.
[8]OLIVEIRA, José Roberto Pimenta. Os Princípios da
Razoabilidade e da Proporcionalidade no Direito Administrativo Brasileiro. São
Paulo: Malheiros Editores, 2006, p. 33.
[9]BONAVIDES, Op. cit., 264.
[10]ALEXY Robert apud Dirley da Cunha JÚNIOR. Op. Cit.,
p. 155.
[11]DWORKIN, Op. cit., 40.
[12] GRAU, Eros Roberto. Ensaio e discurso sobre a
interpretação/aplicação do direito. São Paulo: Malheiros Editores, 2006, 186
[13]REALE, Miguel. Teoria Tridimensional do Direito. São
Paulo: Editora Saraiva, 2010, 57.
[14] JUNIOR, Op. Cit., p.227.
[15] GRAU, Op. Cit., 190.
[16]ÁVILA, Op. cit., 152/153.
[17] Idem, 153/154.
[18] GASPARINI, Diógenes. Direito Administrativo. São
Paulo: Editora Saraiva, 2010, p.78
[19]ÁVILA, Op. Cit., 154/155.
[20] OLIVEIRA, Op. Cit., 150.
[21] STF, 1ª Turma, RE 194952/MS, Ministra Relatora Ellen
Gracie, j. 11.09.2001, DJ 11.10.2001
[22] ÁVILA, Op. Cit., 158.
[23] ROCHA, Cármem Lúcia Antunes apud OLIVEIRA, Op. Cit.,
159.
[24]STF, 2ª Turma, HC 108872/RS, rel. Min. Gilmar Mendes,
j. 06.09.2011, DJe 22.09.2011
[25] BONAVIDES, op. cit., 408.
[26] ÁVILA, op. cit., 166/167.
[27] OLIVEIRA, op. cit., 53
[28] Direito Constitucional e Teoria da Constituição.
Coimbra, Portugal: Editora Almedina, 7ª Edição, 2003.
[29] Virgílio Afonso da Silva. O proporcional e o
razoável. Revista dos Tribunais 798, 2002, p.6
[30]Leituras Complementares de Direito Constitucional.
Bahia: Editora JusPodivm, 2008, p. 64/65.
[31] ÁVILA, op. cit., 182.
[32] AFONSO DA SILVA, op. cit., p. 8.
Autor
Caio Vinícius de
Oliveira Advogado em São
Paulo, militante na área de Direito Público.
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texto
Como citar este texto (NBR 6023:2002 ABNT):
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